Milhares saem às ruas contra o impeachment

Manifestantes contrários ao impeachment da presidenta Dilma Rousseff participaram de atos a favor da democracia em todos os estados e no Distrito Federal.

 

Organizadas pela Frente Brasil Popular, as manifestações reuniuram mais de 800 mil pessoas nesta quinta-feira (31) em defesa da democracia e contra o golpe, de acordo com levantamento da Frente Brasil Popular, organizadora do atos pelo Brasil. As atividades aconteceram em mais de 80 municípios de todos os estados brasileiros e em pelo menos 25 cidades de outros países.

As pessoas saíram às ruas gritando palavras de ordem como “Não vai ter golpe, vai ter luta”. Representantes de movimentos sociais, de estudantes e de trabalhadores estiveram presentes aos atos. Nos estados, Sindicatos de Farmacêuticos e diretores da Fenafar também engrossaram o cordão em defesa da democracia.

Segundo o presidente da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, as manifestações superaram as expecativas dos organizadores e refletem o engajamento da população na luta contra o golpe. “As informações que chegaram são bem acima das expectativas. Havia uma certa preocupação quanto ao ato em Brasília, depois que foi tomada a decisão de descentralizar e realizar atividades em outras cidades. Mas o que vimos foi um ato enorme e, principalmente, muito amplo. Era visível a presença da sociedade, de muitos artistas”, avaliou.

De acordo com ele, por todo país, foi possível perceber que, “diante do golpe em curso, as pessoas se mobilizam, têm a justa percepção de que é preciso combater essa investida contra a democracia”.

Para Adilson, a cada dia, mais elementos ajudam a deixar claro que não há motivos que justifiquem um impedimento da presidenta Dilma Rousseff. “Essa percepção ganha corpo e a sociedade já vê que esse movimento não tem embasamento, atenta contra os interesses do país, agride a Constituição, fere o direito dos que foram às ruas defender um projeto”, disse.

Em Brasília, manifestantes de todo o país aproveitaram a proximidade com o Congresso Nacional para mostrar aos parlamentares o descontentamento com o pedido de impeachment. Mais de 200 mil pessoas ocuparam a Esplanada dos Ministérios. A representante da CUT na Frente Brasil Popular, Janeslei Aparecida de Albuquerque, disse que o ato na capital federal é essencial para o movimento. “Brasília, por ser a capital do país, é fundamental para dar visibilidade à nossa insatisfação com o golpe que está sendo aplicado contra o Brasil. Motivo pelo qual entre 700 e mil ônibus vieram para cá, vindos de todos os estados brasileiros”, disse à Agência Brasil.

Nos Estados

Na capital paulista, as manifestações contra o impeachment e em defesa da presidenta Dilma Rousseff ocorreram na Praça da Sé. Milhares de pessoas se reuniram no local, onde foram instalados quatro carros de som com bandeiras de diversas entidades, entre elas a Frente Brasil Popular, Central de Movimentos Populares (CMP), a Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), a União da Juventude Socialista, além de sindicatos de diversas categorias.

Além da Praça da Sé, a multidão também ocupou a rua lateral da catedral, no centro da capital paulista. O ato foi batizado de “Em Defesa da Democracia, Golpe Nunca Mais”.

Os manifestantes carregavam balões gigantes, bexigas vermelhas e faixas com mensagens contra o impeachment. João Souza Neto, metalúrgico de 47 anos, disse que o motivo do protesto de hoje é contra o golpe e pela democracia. “O impeachment é dado quando há responsabilidade e não há nada que configure crime”, afirmou.

O professor Daniel Eid Garcia, 41 anos, diz que participou de todas as manifestações contra o impeachment este ano. Ele disse que foi ao ato de hoje para reforçar a ideia de que a sociedade não pode aceitar o impedimento da presidenta. “O método [atual] configura golpe, não há sustentação jurídica para o impeachment”, disse.

O coordenador da Central de Movimentos Populares, Raimundo Bomfim, concorda com a avaliação. “Está claro que não tem embasamento jurídico [para o impeachment], a presidenta Dilma não cometeu crime de responsabilidade, será um golpe se isso ocorrer. Nós estamos confiantes que não vai ocorrer. E se ocorrer, o [vice-presidente] Michel Temer já começa um governo deslegitimado”, disse.

Chico Buarque no Rio

No Largo da Carioca, onde milhares de manifestantes se juntaram para fazer a manifestação em favor do governo, a estrela da noite foi o cantor e compositor Chico Buarque que foi ovacionado por gritos de “Chico, guerreiro do povo brasileiro”.

“Eu vim aqui dar um abraço nas pessoas das mais variadas tribos, das mais variadas convicções políticas. Gente que votou no PT, gente que não gosta do PT, gente que foi do PT, que se desiludiu com o partido, gente que votou na Dilma, mas sobretudo, gente que não pode pôr em dúvida a integridade da presidente Dilma Rousseff.”

Segundo Chico, todas as pessoas estavam reunidas em uma “defesa intransigente” da democracia. “Eu vejo gente aqui na praça, da minha geração, que viveu o 31 de março de 1964. Mas vejo, sobretudo, a imensa juventude que não era nem nascida, mas que conhece a história do Brasil.”

Mais cedo, o presidente da Federação das Associações de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj), Rossino Castro Diniz, disse que a população favelada do país, as camadas mais pobres, beneficiários dos principais programas sociais do governo, é contrária ao que chamou de tentativa de golpe contra a presidenta Dilma.

“Isto que está acontecendo aqui é só o início, porque o povo ainda está se conscientizando e o pessoal de favela demora mais para entender o que está ocorrendo. Quando eles forem botar [o impeachment] em votação, nós vamos colocar mais de um milhão de pessoas em Brasília. Os programas do governo beneficiaram a classe menos favorecida, o povo da favela. Quando eles entenderem que podem perder isso, o caldo vai engrossar. E você pode ter certeza, não vai ter golpe”, disse Diniz.

Na capital gaúcha, manifestantes contrários ao impeachment da presidenta Dilma voltaram à Esquina Democrática no fim da tarde. Os movimentos sociais marcam presença. Bandeiras do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), da Central Única dos Trabalhadores (CUT) de movimentos feministas, de negros e da população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e transgêneros) se misturam às faixas de protesto.

Presidenta da União de Negros pela Igualdade no Rio Grande do Sul, Elisa Regina Vargas, afirmou que os protestos contra o governo são de brancos e ricos que não representam o povo. “Se tu vires as manifestações do povo da direita, tu não vais nos encontrar lá. Nós somos a maioria da população brasileira, e nós elegemos a Dilma”, ressaltou Elisa.

Ao som de músicas como Cálice, de autoria de Chico Buarque e Gilberto Gil, e de gritos como “Não vai ter golpe”, representantes de centrais sindicais, movimentos sociais e da sociedade civil fizeram uma caminhada no centro de Salvador contra o impeachment da presidenta Dilma Rousseff.

Um trio elétrico acompanhou o percurso, onde representantes discursaram em apoio à presidenta Dilma. Uma banda em um microtrio elétrico cantou músicas de resistência à ditadura, ao som da guitarra baiana. Segundo a Polícia Militar, cerca de 12 mil pessoas estiveram no ato.

Manifestantes que saíram do Campo Grande, região central de Salvador, se uniram ao grupo que saiu do centro. Com a união dos dois grupos, participavam da passeata, além de partidos políticos, movimentos sociais, centrais sindicais e representantes de grupos minoritários, como pessoas da comunidade LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros) e indígenas da etnia Pataxó, da região sul da Bahia.

Na capital cearense, a concentração do ato contra o impeachment começou na Praça da Bandeira. Cerca de 10 mil manifestantes seguiram em caminhada até a praça do Centro

Presente ao ato, o médico Manoel Fonseca, 70 anos, conta que foi vítima do regime militar. Ele e a esposa passaram 2 anos presos, foram torturados e os filhos sequestrados.Dragão do Mar de Arte e Cultura, na Praia de Iracema, próximo à orla da Beira Mar. A passeata relembrou ainda as consequências do golpe militar de 1964.

“Existe uma similaridade entre o golpe militar e o momento que vivemos hoje, porque querem quebrar a legalidade. Não queremos que as novas gerações passem por isso também. Estamos lutando de novo pela liberdade e pela democracia”, afirmou.

Na capital pernambucana, as faixas e cartazes pediam a saída do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e do vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP). Outras mensagens defendiam políticas públicas criadas pelo governo do PT, como o Minha Casa, Minha Vida, e afirmavam que não era preciso ser petista para “lutar pela democracia”. A maior parte dos manifestantes vestia vermelho, mas muita gente compareceu ao ato de branco e com bandeiras do Brasil. Durante o trajeto, da Praça do Derby até a Avenida Conde da Boa Vista, muitas pessoas demonstraram apoio das janelas dos prédios e dos veículos parados no trânsito.

Em Minas, o ato na capital foi organizado por uma rede de artistas e músicos e recebei o título de “Canto pela democracia”. Músicos, políticos e líderes de movimentos sociais dividiram o palco montado na Praça da Estação, no centro de Belo Horizonte. De acordo com a PM, a manifestação reuniu 10 mil pessoas. Para os organizadores foram 40 mil.

Durante o ato, os manifestantes classificaram o processo de impeachment contra a presidenta Dilma Rousseff de “repetição da História”, em referência a movimentos de oposição aos ex-presidentes Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek.

A advogada Natália Ribeiro, 65 anos, tomou a iniciativa de distribuir 500 cópias da carta escrita por Getúlio Vargas antes de seu suicídio, em 1954. Para ela, os grupos políticos contrários às políticas sociais e trabalhistas que faziam oposição a Getúlio são os mesmos que hoje querem o impeachment da presidenta Dilma Rousseff. “A ideia de fazer as cópias surgiu depois que o Lula [Luiz Inácio Lula da Silva] mencionou a carta em seu discurso no ato do dia 18 de março. Com uma leitura atenta, vemos que o processo é muito similar. Mas a Dilma não vai se suicidar. Não vai ter golpe”, disse.

No palco, o músico Bruno Henrique Tonelli, 29 anos, da banda Tribalzen, foi mais longe na comparação histórica. “Nós vemos brancos, negros, índios, vermelhos, verde-amarelos, todas as cores e raças reunidas em defesa de algo que nós conquistamos muito tardiamente no Brasil, que é a democracia. Os gregos já trabalhavam isso lá atrás”, disse.

Da redação com Agência Brasil e Vermelho