RS: 1ª CESMu denuncia que machismo e sexismo agravam saúde das mulheres

Aconteceu entre os dias 9 e 11 de junho a 1ª Conferência Estadual de Saúde da Mulher do Rio Grande do Sul. O evento foi realizadona Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Entre os debates, os principais fatores que levam ao adoecimento das mulheres gaúchas. Foram apontados situações ligados ao mundo do trabalho, o machismo, o sexismo e as pressões sociais e culturais sobre as mulheres.

 

A primeira mesa, “Saúde das Mulheres: Desafios para a Integralidade com Equidade”, contou com a participação de Carmem Luiz, coordenadora da 2ª Conferência Nacional de Saúde das Mulheres (2ª CNSMu). Além dela, Nadiane Lemos, coordenadora estadual das Políticas de Saúde da Mulher, da SES/RS, e a ex-secretária estadual de Saúde e ex superintendente do Grupo Hospitalar Conceição, Sandra Fagundes, com mediação da psicóloga Carmen Oliveira, uma das coordenadoras gerais da CESMu.

Carmen Luís foi muito aplaudida ao afirmar que “o que mais agrava a saúde das mulheres é o sofrimento mental causado pelo machismo”. Disse que está faltando a tão falada atenção integral na saúde pública, pois as mulheres ainda são reduzidas ao papel de mães, vistas somente como reprodutoras/amamentadoras. “Nossas necessidades são maiores que isto”. Segundo ela, machismo, sexismo e misoginia são problemas fundamentais na vida das mulheres. “Não queremos alijar os homens deste debate, eles precisam nos escutar. E ressaltou que “quem decide sobre nós somos nós mesmas”.

Nadiane Lemos disse que tratar a saúde das mulheres com integralidade e equidade são desafios constantes, devido à diversidade. “Da população que chega aos serviços de saúde, 70% são mulheres, muitas nem são para cuidar da própria saúde, acompanham filhos, maridos, amigos, vizinhos. Elas têm este papel de cuidadoras sociais”.

Sandra Fagundes foi incisiva: “estamos em uma sociedade que diz ser a mulher de segunda (classe), que tem de ser recatada e ver preços nos supermercados”. Conforme ela, “vivemos uma tirania, em que a mulher tem dono, o corpo das mulheres, qualquer um pode meter a mão, inclusive violar, e precisamos romper com isto”. Para ela, muitas vezes, o lugar de romper está nos serviços de saúde.

Fatores que levam as gaúchas ao adoecimento

A segunda mesa da CESMu teve a mediação de Gisleine Silva, uma das coordenadoras gerais da Conferência. A “Situação da Saúde das Mulheres e os Determinantes Econômicos, Sociais e Ambientais que levam ao seu Adoecimento” ficou a cargo de Clítia Back Martins, pesquisadora da Fundação de Economia e Estatística (FEE).

Ao tratar da situação da saúde das mulheres, Clítia informou que a população gaúcha é composta de 51,33% de mulheres e 48,67% de homens. “As mulheres vivem mais, mas também são as que mais adoecem”. O RS é o estado com maior proporção de pessoas acima de 60 anos. Uma em cada seis gaúchas está nesta faixa etária. O índice de mortalidade materna é considerado alto, 48,65% para cada 100 mil nascidos vivos. O Estado também possui incidência de HIV/AIDS maior que a média nacional. Segundo a pesquisadora, apesar de as mulheres terem mais escolaridade que os homens (8,28 anos contra 7, 95 anos), constituírem 59% dos trabalhadores com ensino superior e apenas 17% dos analfabetos, recebem salários menores e trabalham mais.

“O Mundo do Trabalho e suas Consequências na Vida e da Saúde das Mulheres” foi abordado pela psicóloga do trabalho Fabiana Machado, que argumentou ser preciso pensar a saúde aliada às condições de trabalho. “As mulheres tem aumentado sua participação no mundo do trabalho, mas isto não significa que tenham reduzido as desigualdades”. Conforme ela, a diferença salarial é um dispositivo de sofrimento, pois os homens têm sempre mais reconhecimento. “Vivenciamos um processo de adoecimento causado pelo trabalho, recebemos salários inferiores aos dos homens e não há valorização”.

A professora Miriam Alves, da Universidade de Pelotas, falou sobre “Vulnerabilidades e Equidade na Vida e na Saúde das Mulheres”. Ela destacou que um determinante social causador de doença é o racismo. “Este coloca a mulher abaixo de todas as hierarquias”. Ressaltou que as desigualdades verificadas na sociedade colocam as mulheres negras como seres inferiores.

Modelo econômico voltado para o mercado e não para as pessoas

A terceira e última mesa do primeiro dia da CESMu teve a mediação da ex-deputada estadual e ex-vereadora de Porto Alegre Jussara Cony, uma das suas coordenadoras gerais. O tema “O Papel do Estado no Desenvolvimento Socioeconômico e Ambiental e seus Reflexos na Vida e na Saúde das Mulheres” foi tratado pela professora universitária e feminista histórica Carmen Hein de Campos.

Segundo Carmen, não é possível pensar direitos das mulheres, inclusive saúde, sem levar em conta o modelo econômico, político e ambiental posto em prática no país. “ Estamos vivendo tempos vergonhosos, não há nenhuma possibilidade deste governo (federal) liderar o país”. Ela baseou sua fala no documento “Uma ponte para o futuro”, do PMDB, partido que hoje está no governo. “Um modelo pode se preocupar com a população ou com o mercado e está bem clara a opção feita neste momento, não beneficia a população”.

A feminista destacou que o documento está estruturado em vários princípios, entre eles o ajuste fiscal: “para o estado ser funcional, deve distribuir incentivos corretos para a iniciativa privada”, está escrito. Ela sentenciou: “é por isto que este governo distribui enormes incentivos à iniciativa privada e, por outro lado, arrocha salários e termina com os direitos dos trabalhadores; não se preocupa com a sonegação fiscal, não tributa riquezas, mas quer acabar com o pouco que se conquistou em anos”.

Outro eixo apontado por ela no documento é a reforma do orçamento, que desvincula gastos com saúde e educação, hoje previstos na Constituição. “Todo esforço do governo em aprovar as reformas faz parte desta lógica”. Segundo Carmen, ao contrário do que vem sendo dito, de que a Previdência é deficitária, “vários estudos demonstram que não há déficit, o que há é deslocamentos dos seus recursos para outras áreas sem nunca serem repostos”.

Para ela, o modelo imposto privilegia o capital e não quem vive do trabalho. “No Rio Grande do Sul, o projeto é o mesmo e isto não serve para os trabalhadores, não serve para as mulheres, o que precisamos é de uma relação de solidariedade”.

O presidente do Conselho Estadual de Saúde (CES/RS), Cláudio Augustin, falou sobre “Participação Social”. Conforme ele, embora haja a exigência da participação social no SUS, a partir dos conselhos e conferências, boa parte destas estruturas não funcionam. “Isto mostra o grau de atraso que temos na democracia neste país”. Ressaltou que, atualmente, a participação social está muito aquém e que é preciso avançar. “Estamos vivendo um momento muito difícil no Brasil, que exige nossa dedicação e responsabilidade, pois só transformaremos a sociedade se a participação for ampla e com consciência”.

Fonte: da redação com Sindfars
Publicado em 19/06/2017