O presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abes) apresentou questões-chave ao debate Atualização da Conjuntura, a Reforma Trabalhista e Previdenciária e seus impactos na vida da farmacêutica e do farmacêutico.
Neste sábado (27) pela manhã a Fenafar recebeu o presidente da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abes) e técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Carlos Ocké, que abriu a mesa afirmando que “a questão democrática é o centro da luta que está colocada hoje para os trabalhadores e para o povo brasileiro”. Para ele, a reforma tributária deve ser tema central, pois defende a necessidade de mudança da composição da carga tributária, de forma a desonerar as classes populares e médias, que são penalizadas por uma carga que incide sobre o trabalho e sobre a produção, ao passo que não se tributa a alta renda, especialmente a financeira, e o patrimônio.
Esta ideia, bem como outras apresentadas em sua fala, está presente no artigo de sua autoria intitulado Política social, desenvolvimento e cidadania: a história também anda para trás, que compõe a publicação Políticas e riscos sociais no Brasil e na Europa: convergências e divergências, do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), organizada por Paulo Henrique de Almeida Rodrigues e Isabela Soares Santos.
Reformas
A partir da elaboração de André Singer, que caracteriza o lulismo como um projeto de reformismo fraco, e defende a importância de construir condições para a implementação de um reformismo forte, a fim de efetuar reformas estruturantes que passam pelo “controle do câmbio e das finanças; do fortalecimento do investimento público; da universalização das políticas sociais; da reforma tributária, política, agrária e dos meios de comunicação; e, por meio da mobilização da classe trabalhadora e das classes médias em favor de profundas transformações na estrutura social brasileira”. Ocké afirmou que o controle de capitais (regulação dos fluxos financeiros e da volatilidade do câmbio no contexto da globalização) foi defendido pelo próprio Fundo Monetário Internacional como alternativa para evitar novas crises sistêmicas como aquela de 2008, bem como disparou que países como os Estados Unidos e a Inglaterra emitiram moeda para resolver a insolvência do setor bancário e dinamizar a economia naquele momento, em oposição às teses liberais no campo da política monetária que seus líderes defendem para as nações da perifiria capitalista, as quais são alinhadas no fundo com a redução do papel do Estado.
Carlos Ocké defendeu a importância de uma reforma política “nos nossos termos”, e avalia que tal processo poderia ter sido encaminhado em 2002, quando o presidente Lula foi eleito pela primeira vez, ou em 2010, no auge de sua popularidade. Tal defesa vem da convicção apresentada pelo debatedor de que a questão da ética pública é um vetor fundamental na construção de um projeto de desenvolvimento avançado, pois tal ética deve servir para romper com o padrão histórico de dominação burguesa por clientelismo e patrimonialismo. “Esta não é uma questão menor, pois a ética pública opõe-se à ética do mercado: do lucro e do individualismo”, reforça.
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Saúde mais 10
Para o debatedor, é preciso, ainda, de retomar o movimento Saúde mais 10 com mais força. Ele defendeu a universalização das políticas sociais e afirmou que “o sistema de saúde brasileiro acabou se transformando em um mix paralelo e duplicado, no qual o setor privado estabelece uma relação
Para o presidente da Abes, um debate teórico e estratégico deveria residir na avaliação de acertos e erros das experiências de outros países, socialistas ou social-democratas, de indústrias que combatem grandes conglomerados farmacêuticos, que, segundo ele, reduzem-se a são 4 ou 5 grupos.parasitária com o SUS [Sistema Único de Saúde] e com o padrão de financiamento público. Pior: sem força para resistir ao alargamento da hegemonia neoliberal, uma visão fiscalista – promotora do mercado de planos de saúde como solução pragmática para desonerar as contas públicas – é e foi sustentada ideologicamente dentro e fora do Estado”. O palestrante avalia que tal processo favorece o setor financeiro e retira recursos do público, “aumentando mais-valia absoluta e relativa dos trabalhadores, ou seja, retirando direitos trabalhistas”. Afirmou ainda, fazendo referência ao pesquisador inglês da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres David Stuckler, que “recessão fere, mas a austeridade mata”, e completou: “na saúde”.Golpe 2016
Sua avaliação é de que o spread bancário e a redução dos juros promovidos pelo governo Dilma Rousseff foram elementos importantes que levaram à reação que culminou no golpe de 2016, além de ações como o fortalecimento dos BRICs, que na sua opinião exemplificam o caráter contraditório do lulismo.
Diante do momento de crise econômica, social e política, defende a realização de uma Assembleia Nacional Constituinte, tendo por referência experiências da América Latina, como Bolívia e Venezuela. Entretanto, declarou ser sensível ao questionamento apresentado pelo presidente da Fenafar, Ronald Santos, que perguntou se há condições de construção de uma constituinte nesse momento, com essa correlação de forças. O farmacêutico questionou de uma assembleia constituinte permitiria reunir forças sociais e políticas, ou se a resistência, a defesa do Estado Democrático de Direito, a defesa da Constituição, dos direitos e garantias, não seria o elemento que permita a construção de uma frente política ampla, como a conjuntura exige. Ronald defendeu, ainda, a unidade das forças progressistas e da classe trabalhadora e a necessidade de ampliação, reafirmando a importância da construção de uma frente política e social o mais ampla possível, argumentando que essa frente pode construir as condições para se implementarem as reformas mais fortes. “O lulismo se esgotou, a prova são as reformas de natureza fraca. As reformas necessárias são de maior intensidade. Há necessidade de se acumular muita força social e política, se não ficaremos na marcação de posição”, defendeu o presidente da Fenafar.
Carlos Ocké prevê, ainda, o enfrentamento no campo democrático e popular contra a extrema direita em 2018, “sobretudo se a crise econômica se
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aprofundar”, argumenta. Para ele, Temer é um “corpo insepulto, já caiu, pois não tem força política para encaminhar as reformas neoliberais, por isso a direita se dividiu”. Ao definir as práticas das forças que estão atualmente no poder, diz que o regime liberal trabalha com hibridismo, pois há um Estado de exceção seletivo, que atua por meio de sístole e diástole, o que afirma ser um conceito golberiano de inspiração militar. “A ofensiva é fascista, não tenhamos medo dessa palavra”, alerta.
Após as intervenções de diversos representantes de sindicatos dos estados, o palestrante apresentou breves críticas ao papel do juiz Sérgio Moro na atual conjuntura, bem como ao uso de militares para reprimir a manifestação do dia 24 de maio em Brasília, defendeu a unidade argumentada por Ronald Santos, valorizou a greve construída no dia 28 de abriu e defendeu o instrumento da greve geral como forma de contornar o corporativismo, e criticou métodos de luta de jovens que classificou como “combativos”, mas que utilizam métodos que considera equivocados, referindo-se aos black blocks.
Da redação
Publicada em 27 de maio de 2017