Morte de duas farmacêuticas mostra que a luta pelo fim da violência contra a mulher é prioridade

Neste ano, duas farmacêuticas foram assassinadas. “Isso é revoltante e inaceitável. Mostra que a violência contra a mulher não escolhe classe social, nem nível educacional. Não podemos descansar enquanto qualquer uma de nós sofrer algum tipo de violência: física, sexual, moral ou psicológica”, afirma Soraya Amorim, diretora de mulheres da Fenafar e do Sindicato dos Farmacêuticos da Bahia.

 

As duas foram vítimas de crime passional, cometido de forma cruel.

Na Bahia, a farmacêutica Joana Soares Benfica, de 47 anos, foi morta por seu cunhado no dia 3 de janeiro, na casa dela, com várias perfurações pelo corpo. O crime teria acontecido porque a vítima decidiu terminar um relacionamento extraconjugal que tinha com o suspeito. Amigos da farmacêutica contaram que o cunhado tinha uma espécie de obsessão pela mulher. “Não sei se os dois chegaram a ter um caso, mas ela já tinha contado que ele vinha perseguindo ela com uma espécie de obsessão”, disse uma amiga da farmacêutica.

O cunhado, que estava foragido desde janeiro, se apresentou à Justiça em Manhuaçu, na Zona da Mata baiana e assumiu o crime.

Na cidade de Vassouras, Sul Fluminense, o corpo da farmacêutica Nathalie Rios Motta Salles, de 37 anos, foi encontrado carbonizado no dia 23 de junho, dentro de uma pilha de pneus. O suspeito de cometer o crime é um ex-namorado, o dentista Thiago Medeiros, de 33 anos. Apesar do término do namoro, os dois mantinham um relacionamento. Nathalie estava grávida de 3 meses e o dentista não queria que ela fizesse um aborto. Nathalie estava desaparecida desde o dia 22, quando saiu da drogaria da qual é proprietária, na Tijuca, na Zona Norte, para encontrar Thiago na estação do metrô do Flamengo, na Zona Sul. O dentista, em depoimento, confirmou que encontrou a ex-namorada, mas disse que a deixou no Aterro do Flamengo e seguiu para Vassouras. Uma funcionária do consultório do dentista afirmou à polícia que Thiago não costumava ir a Vassouras nas noites de quinta-feira.

Suspeita-se que, dias antes de ser assassinada, a farmacêutica pode ter sido dopada pelo dentista. Segundo a depoimento de parentes da vítima, na segunda-feira (19), três dias antes de desaparecer, Nathalie foi a uma consulta dentária no consultório de Thiago. Quando voltou para casa, teria afirmado a seus parentes que seu ex-namorado havia lhe dado um líquido que a deixou tonta, e logo foi dormir. Na ocasião, ela precisou ser colocado num táxi para voltar para casa. O dentista foi preso na tarde do dia 25, acusado do assassinato da ex-namorada.

“A morte destas colegas é muito triste. É preciso conscientizar as mulheres sobre os mecanismos legais de prevenção da violência contra a mulher conquistados com muita luta na Lei Maria da Penha. Acionar as delegacias da Mulher, fazer a denúncia contra os abusos e ameaças seja nas delegacias, nas varas judicias ou pelo Disque 180”, explica Soraya.

A Fenafar foi uma das entidades do movimento social que participou ativamente dos debates e da luta que culminaram na aprovação da Lei Maria da Penha. “E vamos continuar essa luta. Porque ter conquista a lei é importante, mas o mais urgente é combater a violência na sociedade, com informação, formação e, principalmente, apoiando as mulheres vítimas de qualquer forma de violência a se proteger e a denunciar o agressor, que na maioria dos casos é alguém próximo da mulher, o que torna mais difícil a denúncia”. A lei leva o nome de uma farmacêutica, Maria da Penha, que foi vítima de violência doméstica.

A cada 7 minutos, uma mulher é vítima de violência

No Brasil, dois terços das denúncias de violência contra a mulher têm algo em comum: são praticadas por atuais ou ex-companheiros, cônjuges, namorados ou amantes da vítima. Entre os tipos de violência conjugal estão a violência física, psicológica, moral, sexual, patrimonial, entre outras.

Segundo o boletim da Central de Atendimento à Mulher, o Ligue 180 da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres (SPM), de 67.962 relatos de violências, 67,63% aconteceram em um relacionamento heterossexual. Em 41% dos casos, a relação durava há mais de 10 anos, e em 39,34%, a violência é diária. (dados de novembro de 2016)

Dos 4.762 homicídios de mulheres registrados em 2013, 50,3% foram cometidos por familiares, sendo que a maioria desses crimes (33,2%) tem parceiros ou ex-parceiros como autores. De cada sete feminicídios, quatro foram praticados por pessoas que tiveram ou tinham relações íntimas de afeto com a mulher.

A situação é ainda mais preocupante em relação às mulheres negras – entre este grupo, o número de mortes aumentou 54% em dez anos, passando de 1.864, em 2003, para 2.875, em 2013. Na mesma época, a quantidade de homicídios de mulheres brancas caiu 9,8%, de 1.747 para 1.576.

A diretora de Mulheres da Fenafar enfatiza que “a violência contra as mulheres é uma questão de saúde pública. É urgente e necessário umum diálogo amplo intersetorial, para tratar do assunto e  fortalecer a aplicação das políticas públicas conquistadas, buscando que as ações tenham maior eficácia”.

Da redação com agências