Mais de 300 farmacêuticos e técnicos de farmácia, além de representantes dos mais variados movimentos sociais e de trabalhadores lotaram o auditório do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo na manhã de sábado, 04, para mostrar que não será fácil para o prefeito João Dória privatizar a distribuição dos medicamentos gratuitos na cidade de São Paulo.
A proposta do novo prefeito é acabar com as farmácias dos postos de saúde da cidade e transferir para as drogarias privadas (principalmente as grandes redes) a distribuição dos medicamentos.
O presidente do Sindicato dos Farmacêuticos de São Paulo, Glicério Maia, afirmou na abertura da assembleia que medidas, como esta, fazem parte da política privatista que marca a gestão da nova prefeitura. “Direitos básicos não são privilégios. Independente de nossas posições ideológicas vamos lutar por nossos direitos. Há dois direitos básicos que são inalienáveis e que queremos defender, a liberdade de expressão, de manifestação e a Saúde”.
Glicério explicou que o sindicato tomou conhecimento da proposta pela mídia e que em seguida oficiou o prefeito pedindo mais explicações e fazendo várias perguntas. Depois de uma reunião com o secretário de Saúde, as perguntas continuaram sem resposta. “Houve o compromisso de que os profissionais não seriam demitidos, o que não nos convenceu. Imediamentamente iniciamos um intenso debate com a categoria nas unidades e convocamos esta assembleia, que tem o objetivo de definir diretrizes para impedir que tenhamos retrocessos na saúde pública”, disse o presidente do Sinfar-SP.
presidente da Fenafar e do Conselho Nacional de Saúde, Ronald Ferreira dos Santos, disse que este é um momento de mobilização para defender direitos que estão seriamente ameaçados no nosso país. Esta proposta que aparece em São Paulo é mais um exemplo disso. Além do direito à saúde e à Assistência Farmacêutica, há uma ofensiva contra os direitos trabalhistas, a reforma da previdência. “Por isso, ver este auditório lotado hoje é uma alegria”.
“Mas este tema, a defesa da Saúde e da Assistência Farmacêutica em particular é muito caro para o Conselho Nacional de Saúde e para a Fenafar. A Constituição de 1988 definiu que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado. Demoramos 14 anos para mostrar que, para garantir este direito, era preciso colocar o medicamento, o profissional farmacêutico e a farmácia num patamar diferenciado”, lembrou Ronald. “Foi a 1ª Conferência Nacional de Medicamentos e Assistência Farmacêutica que defeniu o medicamento como um insumo garantidor do direito à saúde e que conferiu à farmácia o conceito de estabelecimento de saúde. E agora, o que eles querem neste momento não é romper só com a Assistência Farmacêutica, é colocar tudo na mão do mercado, como se o mercado tivesse condições de atender as demandas do povo brasileiro, o que é uma grande mentira”.
Mobilização para garantir a manutenção dos direitos
Ronald afirmou que o CNS não vai medir esforços para impedir o desmonte da Assistência Farmacêutica – propostas como a de São Paulo, também aparecem em Belo Horizonte e em outras cidades. “Vamos acionar o Ministério Público, o Judiciário, o Legislativo e vamos mobilizar a sociedade, os conselhos municipais e estaduais. Vamos resistir para impedir que este discurso se materialize– porque por enquanto é só discurso, é marketing, propaganda para vender a ilusão de que o mercado vai garantir o direito”, afirmou.
O presidente da Fenafar concluiu conclamando todos a se mobilizarem. “Estão construindo na base do discurso do ódio e da falta de solidariedade – um discurso que divide, que não une – uma plataforma privatista para 2018. O antídoto a este tipo de déspota, a este tipo de política que vem retirar o direito é a própria defesa da Saúde. O antídoto é utilizar todo o potencial que o direito à vida, o direito ao outro viver, reúne para enfrentar estas forças da escuridão e do mal que querem trazer um longo anoitecer para o Brasil e para São Paulo. Mas eu tenho convicção que cada um, com a sua luz, com a sua capacidade de iluminar, não permitirá que esta noite seja muito longa. Se cada um de nós aqui – entendendo a importância da solidariedade e do direito à vida – participar, acender a sua luz, tenho certeza que nós teremos um breve amanhecer, aqui para São Paulo e para o Brasil”.
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A vereadora Juliana Cardoso foi dar seu apoio ao movimento e levou alguns dados para a Assembleia, para demonstrar o perigo que a proposta de Dória representa. Ela afirmou que as 574 farmácias das unidades básicas de saúde da cidade encontram-se, principalmente, nas regiões mais periféricas. “Quando dizemos que vamos tirar as farmácias das UBS’s que está lá na franja do bairro, da periferia, para colocar nas farmácias privadas, isso vai aumentar a distância entre o usuário e o medicamento. Porque a dona Maria e o seu João, que moram lá na periferia, eles vão precisar pegar um ônibus para ir até a farmácia – que está na região mais central do bairro. E geralmente as pessoas que mais precisam dos medicamentos distribuídos na UBS têm dificuldade de locomoção. Além de a farmácia ser mais distante, os usuários não terão a prestação adequada da Assistência Farmacêutica para orientar o usuário como utilizar o medicamento. Isso é uma forma de quebrar o SUS”, afirmou. A vereadora também salientou a importância da representatividade da Assembleia e destacou que é preciso mobilizar a população para defender a manutenção das farmácias no SUS.
Ataques às farmácias no SUS em outras cidades
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Rilke Novato, diretor de relações institucionais da Fenafar, veio de Belo Horizonte para trazer sua solidariedade e experiência de luta contra propostas semelhantes à apresentada por Dória. Ele contou que o Sindicato dos Farmacêuticos de Minas Gerais enfrentou duas situações semelhantes em 2015, na cidade de Contagem, e agora em Belo Horizonte. “Em Contagem nós conseguimos reverter em função da mobilização da sociedade, do controle social, de outros sindicatos e dos usuários. O que havia era uma minuta de decreto para um programa chamado Remédio Fácil que propunha a distribuição de medicamentos pela rede privada, desconsiderando todo o equipamento de farmácias nas unidades de saúde, o trabalho da assistência farmacêutica e de toda a equipe das farmácias, dificultando o acesso da população. Fizemos o debate com vereadores e com o secretário de saúde e conseguimos matar a proposta no seu nascedouro”.
Agora, o sindicato enfrenta novamente proposta parecida apresentada pelo novo prefeito sob o argumento de tentar resolver o problema da distribuição de medicamentos na cidade. “A nossa ação foi mostrar que essa proposta não se sustenta. Primeiro pelo aspecto legal, já que a Assistência Farmacêutica é uma atividade fim, atende diretamente o usuário e portanto não pode ser transferida para a rede privada. Uma das nossas iniciativas foi ingressar com uma ação no Ministério Público, na Promotoria da Saúde e de Defesa do Patrimônio Público. Também é preciso mostrar para a população que é uma falácia absurda dizer que levando a distribuição para a rede privada vai melhorar o acesso. Tem bairros em Belo Horizonte que não tem nenhuma drogaria, mas tem lá o seu posto de saúde”, ressaltou Rilke.
Unidade em defesa da Assistência Farmacêutica
A representante do Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo (Sindsep) Lourdes Rocha foi taxativa ou dizer que sim, os trabalhadores estão
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lutando pelos seus empregos, “mas nós também somos essa população que vai deixar de ter o acesso ao medicamento. Nós queremos a farmácia aberta e não vamos abrir mão desse direito”. Ela também ressaltou que não é só a farmácia que está sendo terceirizada, mas todos os serviços públicos da cidade de São Paulo, por uma política que prega o estado mínimo na qual o primeiro a pagar é o trabalhador.
Representando os técnicos em farmácia, Fabiano Soares reforçou que todos os profissionais estão ali pelo mesmo objetivo e que quanto mais unidade o movimento obtiver será melhor para alcançar vitórias. “O SUS não é um presente, é uma conquista da luta de muitas pessoas. E esta proposta é um desrespeito aos princípios do SUS, como a universidalidade. Esse modelo do Dória vai garantir acesso universal? Não vai! Esse é um momento de união em defesa da Assistência Farmacêutica”.
A farmacêutica Luciana, que há 12 anos atua em uma farmácia pública, disse “o nosso interesse fundamental é o direito da sociedade. O avanço da Assistência Farmacêutica no SUS é feito por nós, quando nós fazemos uma consulta farmacêutica, alinhamento de medicamentos, fazemos o fracionamento e ajudamos a população a fazer o uso correto do medicamento. A farmácia no SUS funciona sim e temos que trazer a população para o nosso lado nesta luta”.
Na assembleia foi aprovada a constituição de uma comissão para acompanhar de perto o tema e encaminhar as tarefas imediatas como: produzir uma carta aberta de esclarecimento para a população, elaborar uma denúncia ao Ministério Público Estadual, acionar a Comissão de Direitos Humanos da OAB, as comissões de saúde da Câmara Municipal, Assembleia Legislativa e Câmara dos Deputados, realizar audiências públicas na Câmara Municipal sobre o tema, fazer um ato público e um abaixo assinado popular, além de aprovar que o sindicato apoio todas as lutas contra as privatizações na cidade de São Paulo.
Renata Mielli, de São Paulo