Fenafar: Ampliar a mobilização em defesa do Brasil, dos direitos dos trabalhadores e da democracia

A crise política e econômica e os desafios do movimento sindical foi o debate que abriu, nesta quinta-feira (10), o Seminário de Planejamento Estratégico da Fenafar realizado em São Paulo. Para falar sobre o tema foram convidados o economista e consultor sindical João Guilherme Vargas Neto e o vice-presidente da CTB, Nivaldo Santana.

por Renata Mielli, de Campinas

 

João Guilherme abriu a discussão apresentando um panorâma da atual crise política, que se intensifica e acelera de forma rápida no país. O consultor procurou traçar um paralelo entre a crise e os desafios do movimento.

“Nós estamos numa conjuntura, raciocinando a partir do movimento sindical, defensiva. Em primeiro lugar porque o Brasil é a 10ª economia do mundo, mas é uma economia subsidirária, menor. Nesta semana, fundos públicos mundiais, aplicadas com juros negativos, somaram duas vezes o PIB brasileiro, 7 trilhões de dólares”.

Então a primeira grande dificuldade que me leva a garantir que vivemos numa situação defensiva, é a crise econômica, é a recessão. São 9 milhões de trabalhadores demitidos, que faz o dedaço do jovem, do metalúrgico, do trabalhador qualificado. No desemprego o dedaço é jovem, metalúrgico e qualificado. É um desemprego ruim. Nós estamos lutando numa situação adversa e nós temos que ter muita atenção”.

A segunda dificuldade advém de uma situação brasileira específica, disse João Guilherme. “No dia 24 de outubro de 2014 a presidenta Dilma foi eleita. Ela foi eleita pelos números frios das urnas. Todos os outros elementos de hegemonia lhe eram desfavoráveis – a mídia, o empresariado, o judiciário, tudo era desfavorável. Então em novembro foi cometido um grave erro, que foi não compreender esse quadro”.

Eixos para atuação

Neste quadro, João Guilhereme apontando o que são, ao seu ver, os três eixos que devem nortear a ação sindical neste contexto.

O primeiro princípio destacado por João Guilherme “não deixar que a crise político-institucional penetre no movimento sindical, dificultando ainda mais uma luta que já difícil por si mesma devido à recessão (pelo emprego e salário e em defesa dos direitos dos trabalhadores).”

O segundo é enfrentar a onda conservadora e o discurso moralista e justiceiro amplificado por setores do Judiciário e da mídia. “Em momentos de recessão, de ampliação do desemprego, ganham força as ideias de corte dos salários, de quebra dos direitos, de abandono da política de valorização do salário mínimo, de destruição de empresas e enfraquecimento do poder social do Estado. É preciso identificar com precisão todos os fatores de retrocesso e seus porta-vozes, muitos dos quais são lobos em pele de ovelha (trocar o legislado pelo negociado, por exemplo)”, afirmou. Ele ressaltou ainda que toda “essa onda conservadora é vetorizada na mídia. Isso existe como se fosse um vírus, uma ideia solta no ar”.

O terceiro princípio é o de garantir uma plataforma mínima pela retomada do crescimento com distribuição de renda, um Compromisso pelo Desenvolvimento. “Em sã consciência não é hora de discutir Previdência (e muito menos a quebra de direitos previdenciários), mas é hora de somar esforços para destravar a economia, barrar o desemprego, controlar a inflação, aumentar a produtividade e evitar o desmanche social”, reforçou João Guilherme.

Sobre o quadro de recessão na econômica, o economista lembrou que há os últimos dados divulgados sobre à queda do PIB em 2015 são assustadores, por isso “torna-se cada vez mais urgente e necessária a luta pela retomada do desenvolvimento, já que a recessão não é natural nem eterna”. Neste sentido, João Guilherme problematiza os dados brutos e afirma que, apesar dos números negativos, “há setores e grupos empresariais que estão com bom desempenho (principalmente aqueles ligados a exportação, a alguns tipos de manufaturas e os que incorporam alta tecnologia). Mesmo na indústria, setor avassalado pela recessão, mas que apresentou em janeiro um crescimento de 0,4%, uma análise criteriosa aponta inúmeras situações diferenciadas.”

Defender conquistas

Nivaldo Santana que fez uma apresentação mais detalhada sobre a estrutura sindical, falou das conquistas históricas da classe trabalhadora como a “Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o artigo 8º da Constituição de 1988 e a legalização das centrais sindicais e afirmou que todas ocorreram em conjunturas políticas de avanço da luta política democrática. Todas foram medidas avançadas. Então toda essa discussão da estrutura sindical que temos realizado no interior do movimento (imposto sindical, unicidade sindical, ministério público do trabalho, emenda 45, entre outras) eu diria que sempre devemos contextualizar politicamente. Digo isso porque na atual conjuntura de onda conservadora e dificuldades, acho que o desafio é segurar o que temos, o que conquistamos. Temos que atuar de forma defensiva. Mexer em qualquer coisa da estrutura sindical hoje é uma fria. Porque a tendência, ao meu ver, é que se mexermos vai piorar. O ditado da hora é ‘deixa como está para ver como fica’. Porque estamos vivendo num momento de defensiva estratégica no campo da luta dos trabalhadores e democráticas”, afirmou.

Sobre a conjuntura política atual, Nivaldo avalia que “o problema principal que estamos enfrentando é que o Brasil está vivendo um impasse político. E todo impasse precisa de uma solução. E a solução dos impasses políticos dependem fundamentalmente da correlação de forças. É ela que determina para que lado nós vamos. O drama é que estamos num impasse político e numa correlação de forças desfavorável para a luta democrática e dos trabalhadores”.

Nivaldo descreve porque a correlação de forças é desfavorável: “o governo não tem maioria no Congresso Nacional, não tem maioria na sociedade – o índice de popularidade é baixo o que reflete que a maioria é contra o governo. Além disso o governo está enfrentando um período de recessão. Quando a economia vai mal, se dissemina na sociedade uma insatisfação generalizada. Mesmo as excessões justificam a regra. O que está em curso hoje no país é uma consertação política das classes dominantes para ver como tirar a Dilma da presidência da República. E como a política vive de símbolos, ontem (09/03) houve um jantar na casa do senador Tasso Jereissati que reuniu a cúpula do PMDB e do PSDB. Me parece que o PMDB que tem sido nos últimos anos o fiel da balança na polarização política brasileira entre PT e PSDB está se inclinando para o lado de lá. E não estamos conseguindo reagir. É um organismo que está recebendo medicamentos mas o corpo não reage”, avalia.

Durante o debate, muitos diretores se posicionaram sobre a situação política e a atuação sindical, apontando que a onda conservadora atinge a categoria farmacêutica mas que é preciso enfrentar o debate.

Aproximar a categoria da luta geral e específica

Dialogando com o primeiro eixo apontado na fala de João Guilherme, a tesoureira da Fenafar, Célia Chaves, concordou com a diretriz de que não podemos deixar a crise contaminar a nossa ação como movimento sindical, mas chamou a atenção de que o desafio é “como aproximar a categoria da luta a partir de um benefício imediato e não apenas por um debate mais amplo vinculado à conjuntura econômica e política. Esse desafio é relacionar o campo imediato da luta da categoria com a luta mais geral e trazer o trabalhador para a luta sindical e para a luta mais geral”.

A diretora regional Sudeste, Junia Dark, disse que o debate ajudou a armar os dirigentes sindicais a enfrentar o processo de negociação que está em curso e lembrou, referindo-se aos segmentos da economia que apresentam ganhos, que “a recessão não existe para a indústria farmacêutica que é o setor que nós negociamos”.

A diretora de Saúde e Segurança do Trabalho Eliane Simões e o diretor suplente Dalmare Anderson ressaltaram no debate que a luta do movimento sindical e dos trabalhadores não pode se restringir aos temas salariais. “Temos que lutar pela dignidade do trabalhador, estamos adoecendo pela imposição do capital, pelo assédio moral, pela falta de qualidade no ambiente de trabalho”, disse Eliane. Dalmare reforçou o tema e falou da “importância de se preservar o trabalhador como ser humano”.

Rilke Novato, diretor de Relações Institucionais, falou que a tarefa dos dirigentes sindicais em momentos de crise acirrada como está é “levar para as nossas bases esse debate, fazendo uma reflexão nacional e internacional da crise econômica. Não podemos mais fazer de conta que todo este debate passa ao largo da nossa profissão”.

A segunda vice-presidente da Fenafar, Veridiana Ribeiro também ressaltou o que os palestrantes disseram a respeito do momento político adverso. “Um número grande de colegas não querem fazer o debate político. Outros, que se propõem a fazer estão desiludidos. Mas temos que manter o debate e defender a democracia”.

Fábio Basílio, vice-presidente da Fenafar, concordou com as colocações e com a tarefa que está colocada para o movimento social de defender a democracia e a legalidade, mas não se furtou de fazer a crítica: “o pior crime que o governo cometeu foi ter se afastado da base social que o elegeu”.

Por fim, o presidente da Fenafar, Ronald Ferreira dos Santos, lembrou das resoluções aprovadas no último Congresso da Fenafar que dialogam com a conjuntura atual e armam a Fenafar para atuar neste ambiente de crise política.

“Vou ler aqui algumas das nossas resoluções que são o guia para a nossa ação política. Item 29 – Defender o Estado Democrático de Direito socialmente referenciado, com respeito à cidadania, à dignidade humana e à soberania do Brasil; 30. Enfrentar com coragem e ousadia a onda conservadora de cunho fascista que ressurge alimentada pelo ódio, o preconceito e a intolerância, valorizando os princípios fundamentais do mundo do trabalho, da solidariedade, a paz e o respeito à dignidade humana; 31. Lutar contra a ofensiva conservadora que está em curso, em especial no Congresso Nacional, denunciando tentativas de aprovação de projetos de leis que atentem contra o Estado laico, os direitos trabalhistas, a autonomia sindical, direitos da juventude, direito dos idosos, direitos humanos, a participação popular, o SUS público, a demarcação de terras indígenas e outros povos tradicionais, os direitos dos LGBT e outros segmentos sociais, e demais conquistas populares; 32. Defender intransigentemente a democracia e a soberania do voto popular, repudiando tentativas de setores da sociedade, apoiados pela grande mídia, que querem impor o impeachment ao mandato da presidenta Dilma. Ou seja, a Federação dos Farmacêuticos tem posição. Estamos vivendo um processo de golpe e ruptura institucional do nosso país, que afeta diretamente os direitos dos trabalhadores. Nossa tradição nunca se pautou por debates políticos partidários, mas também nunca se furtou de interferir e se posicionar no debate político geral do país. Estamos vivendo um momento de crise internacional na economia, que impacta no país. Mas aqui no Brasil, essa crise é incrementada por uma onda golpista. Como movimento sindical não podemos assistir este processo e não se posicionar”, afirmou.

Ronald lembrou ainda a contribuição da Fenafar na construção da unidade do movimento social. “Nós temos buscado construir a Frente Brasil Popular, que reúne centrais sindicais, movimentos populares da cidade e do campo, procurando fazer uma resistência. Porque o objetivo da direita não é apenas tirar a presidenta da República. O que eles querem é mudar a orientação política que vinha sendo adotada, é retirar as conquistas sociais e dos trabalhadores. É um projeto que coloca a competitividade no lugar do cooperativismo, é a lógica do preconceito e do discurso do ódio, da primazia do mercado sobre o Estado. E para alterar este projeto é necessário fazer uma ruptura. E é isto o que eles estão tentando fazer. O movimento social precisa ter força para sair às ruas e impedir o avanço desta agenda conservadora. E a palavra-chave neste momento de enfrentamento é a ampliar a mobilização para além dos setores da esquerda e do movimento social”.