Seminário nacional reúne conselhos de saúde e reivindica financiamento adequado para o SUS

Convidados defendem revogação imediata da EC 95/2016, principal deliberação da 16ª Conferência Nacional de Saúde (8ª+8), durante o Seminário Nacional de Orçamento e Financiamento do SUS que aconteceu no dia 23/10, na Fundação Oswaldo Cruz, em Brasília. O evento reuniu conselheiros e conselheiras estaduais e municipais, além de ativistas de todo o país e parlamentares, com o objetivo de encaminhar articulações concretas após a 16ª Conferência Nacional de Saúde (8ª+8).

 

 

Entre as principais deliberações da 16ª Conferência, está a revogação imediata da Emenda Constitucional (EC) 95/2016, medida esta responsável por um prejuízo ao Sistema Único de Saúde (SUS) estimado em R$ 400 bilhões pelos 20 anos de vigência da mudança na Constituição de 1988. Fernando Pigatto, presidente do CNS, defendeu não só o fim da EC 95, mas o retorno do debate sobre a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 1/2015, que dispõe sobre o valor mínimo a ser aplicado anualmente pela União em ações e serviços públicos de saúde, de forma escalonada.

“As reflexões que vamos fazer aqui hoje são à luz do que foi construído na 16ª Conferência. Somos protagonistas e agentes do SUS. Estamos em marcha, com a soma dos nossos esforços, intensificando tudo que já foi feito até aqui”, disse. A representante da Fiocruz e ex-presidenta do CNS, Socorro de Souza, alertou que a austeridade fiscal está “reduzindo serviços, gerando desproteção aos usuários do SUS”. Para ela, defender o SUS, significa “compromisso com a democracia”.

O Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) e o Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) também reafirmaram a necessidade urgente de revogação da EC 95. “Cotar investimentos aumenta desigualdades”, disse Brenda Leite, do Conasems, mencionando outro fator prejudicial ao sistema de seguridade social. “A proposta de Reforma da Previdência como está não corrige a injustiça tributária do nosso país”, disse.

Viviane Rocha, do Conass, classificou o atual orçamento como “deficitário” e pediu atenção à pauta da Desvinculação das Receitas da União (DRU), mecanismo que permite ao governo federal usar parte dos tributos federais vinculados por lei a fundos ou despesas. Diante das emendas recentes, o governo passa a ter mais possibilidade para uso do recurso conforme interesses de gestão, podendo causar prejuízos às políticas de Estado, fundamentais para a manutenção dos direitos sociais.

A conselheira nacional de saúde Sueli Barrios, membro da Associação Nacional Rede Unida, alertou que a Reforma Trabalhista, aprovada em 2017, já vem trazendo inúmeros danos à saúde de trabalhadores pelo país. “Temos muitos profissionais adoecendo, nunca senti tanta fragilidade e ameaça ao SUS como agora”, disse ela, que representa o segmento de trabalhadores da saúde no CNS.

Neilton Araújo, conselheiro nacional de saúde representante do Ministério da Saúde, explicou que o orçamento do SUS sempre foi uma “queda de braço” com o governo federal, em todas as gestões. Para ele, é necessária uma articulação maior entre governo, sociedade e universidades. “Estamos aqui para respondermos como vamos articular nossas forças em defesa do SUS”, defendeu. André Luiz de Oliveira, conselheiro nacional de saúde representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), afirmou que “o controle social é responsável por defender o financiamento adequado da Saúde. A sociedade precisa enxergar o SUS como patrimônio do país”.

Articulação com o parlamento brasileiro

Uma das principais forças de atuação do CNS na atual gestão é uma articulação cada vez mais intensa com a Câmara dos Deputados e o Senado Federal. Em média, uma vez por semana, representantes do conselho estão participando ativamente de audiências, seminários e debates no congresso brasileiro. A deputada federal Carmen Zanotto, que preside a Frente Parlamentar Mista da Saúde, alertou que “as emendas parlamentares muitas vezes podem gerar desordem nos serviços de saúde porque são incrementos temporários”.

Por isso, as ações e investimentos definidos com base em evidências científicas são fundamentais, afirmou a deputada federal Adriana Ventura. “Ainda temos um problema grande de má gestão. Temos tantos especialistas e continuamos definindo políticas sem base nas evidências”. Ela também criticou o dinheiro usado nos processos de Judicialização na Saúde. “São R$ 7 bilhões anuais, não é certo privilegiar uns em detrimentos de outros”. O seminário segue hoje com debates que trazem como tema “Marchas e Contramarchas do SUS: Democracia, Financiamento e Pacto Federativo” e “Relação Público Privado na Saúde do Brasil”.

Planos de saúde parasitam o SUS

Os planos de saúde estão ficando cada vez mais caros no Brasil, muitas vezes potencializados pelo próprio Estado, que favorece o crescimento dos serviços privados de saúde em detrimento do Sistema Único de Saúde (SUS). A partir dessa problemática, o Seminário Nacional de Orçamento e Financiamento do SUS, realizado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Brasília, debateu nesta terça (23/10) o tema Relação Público-Privado na Saúde do Brasil.

A economista Rosa Maria Marques, presidenta da Associação Brasileira de Economia da Saúde (Abres), criticou a regra do Imposto de Renda, que garante dedução dos gastos particulares com saúde na hora da declaração anual do contribuinte. Segundo ela, esse é um dinheiro que poderia estar sendo investido no SUS. “Essa isenção potencializa a saúde privada. Estamos usando financiamento do Estado para as empresas de saúde. Precisamos de uma estratégia de sustentação para o SUS”, disse.

O mesmo foi destacado pelo pesquisador Carlos Ocké, representante do Instituto Brasileiro de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). “Com a renúncia associada aos planos de saúde, o Estado deixa de arrecadar”, explica. Segundo dados do Ipea, em 2014, os cofres públicos poderiam ter arrecadado R$ 28.938 milhões. Em 2017, esse número aumentou para R$ 45.381 milhões. Dinheiro que poderia estar sendo aplicado em políticas públicas de saúde.

PL pode potencializar planos de saúde e prejudicar do SUS

O pesquisador também criticou o Projeto de Lei (PL) dos “Planos de Saúde Populares”, que que quer potencializar o mercado de planos de saúde reduzindo coberturas e diminuindo do rol de procedimentos médicos e tratamentos que hoje são obrigatórios. O PL também propõe mudança da lógica do ressarcimento das empresas ao SUS, incentivando a “dupla porta”, ou seja: o atendimento de clientes de planos de saúde nos serviços públicos sem que as empresas paguem ao SUS o valor dos procedimentos.

“Isso só amplia a desregulação do mercado. Os planos de saúde parasitam o SUS por meio de subsídios”, disse Ocké. Gulnar Azevedo, presidenta da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), afirmou que mesmo com os desafios e problemas do SUS, “a saúde pública ainda é melhor que a saúde privada porque os planos de saúde não conseguem dar acesso integral como o SUS consegue”. Ela defendeu que é urgente a necessidade do retorno da vinculação dos lucros do pré-sal à Saúde e à Educação.

Da redação com SUSConecta
Publicado em 29/10/2019