A possível transformação pelo Complexo Industrial da Saúde

Carlos Gadelha defende – e CNS aprova – um projeto que pode tirar o país da regressão produtiva, gerar conhecimento e garantir emprego para a população. A ideia é apostar no SUS e na Saúde como caminho para a superação da crise.

Uma matéria publicada em 22/7 no site da Agência Brasil mostra a maneira como o governo Bolsonaro procura lidar com o problema da falta de medicamentos no país. A nova ideia do ministério da Saúde é facilitar os trâmites para importação de remédios – seja simplificando regras na Anvisa, seja acabando com impostos. O governo voltou a culpar a guerra na Ucrânia pela crise de desabastecimento, argumento questionado por José Gomes Temporão, ex-ministro da Saúde, em entrevista recente ao Outra Saúde.

Não precisava ser assim, e uma saída robusta para o problema está no Complexo Industrial-Econômico da Saúde (Ceis), tema debatido na última Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS), em 20/7. Bem mais que uma solução-remendo para a falta de medicamentos, a aposta na reindustrialização do Brasil por meio de investimento em ciência e tecnologia na área da Saúde pode ser uma saída para a crise econômica e social em que o país se encontra. Essa foi a defesa principal da fala de Carlos Gadelha, pesquisador do Departamento de Administração e Planejamento em Saúde da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fiocruz (Daps/Ensp), durante o debate.

O Complexo Econômico-Industrial da Saúde pode ser o novo vetor do desenvolvimento nacional, argumenta Gadelha. E um desenvolvimento que sirva para transformar a vida da população e não meramente para impulsionar a economia, como defendia o economista Celso Furtado, diversas vezes citado pelo pesquisador. Segundo Gadelha, é assustador que o Brasil esteja sofrendo com a falta de medicamentos básicos, como amoxilina, dipirona e penicilina. Mas não surpreendente, dado o avançado processo de desindustrialização em que o país se encontra. O mapa abaixo, exibido na apresentação do pesquisador, mostra os principais produtos exportados por cada estado brasileiro.

Gadelha apresentou, então, de que maneira o Complexo Industrial da Saúde poderia livrar o país dessa posição de fazenda do mundo. A chave está justamente no Sistema Único de Saúde. Ele explica que a base estrutural e econômica do SUS é um complexo que pode mobilizar a indústria, os serviços e os sistemas de informação e comunicação. Essa é a área-chave para que o país entre, enfim, na 4ª Revolução Industrial, defende o pesquisador, que exibiu o diagrama abaixo.

Não se trata de simplesmente produzir alguns itens, mas de criar uma cadeia que abasteça a Saúde. Ela fabricará desde produtos de menor complexidade, como ventiladores, aos Ingredientes Farmacêuticos Ativos (IFAs), essenciais para produção de vacinas e medicamentos e a equipamentos hospitalares e para exame de imagem muito sofisticados. As encomendas estarão garantidas, pelo próprio SUS e as demandas de seus 200 milhões de usuários e rede de assistência espalhada por todo o território. Ao invés de importar tudo isso (sujeitando-se a crises como a atual), o Brasil, produzirá internamente, gerando ocupações industriais qualificadas e desenvolvendo tecnologia. A produção de ciência e conhecimento poderia alçar o Brasil a outro patamar.

“O que o Brasil tem que fazer em um momento de crise é investir em Saúde, porque isso gera emprego, reduz a fome e gera desenvolvimento, inovação e crescimento do PIB”, resume Gadelha. E termina: “Se a gente não tem base, capacidade científica e tecnológica de produção, o conhecimento gera produtos fora do país e a gente continua sendo vulnerável e dependente”. Sua fala foi complementada pela deputada federal Jandira Feghali. Presidente da subcomissão do Complexo Industrial e Econômico da Saúde na Câmara dos Deputados, ela ressaltou que o Brasil está fora deste debate, tamanha a pequenez atual de sua indústria. E citou algumas das propostas elaboradas em um relatório que deverá ser divulgado em breve em defesa da proposta.

Gadelha concluiu sua apresentação defendendo veementemente que o Conselho Nacional de Saúde coloque o projeto do Complexo Industrial da Saúde como grande prioridade nas futuras propostas de política nacional de saúde. Sua proposta foi aprovada por unanimidade. Resta agora criar as condições políticas para implementá-la.

Fonte: OutraSaúde