Os ministros do STF decidiram por unanimidade que os planos de saúde paguem ao SUS pelo tratamento de seus clientes na rede pública. Levantamento do Ministério da Saúde estima que a atual dívida dos planos de saúde com o Estado é de R$ 5 bilhões.
O reembolso dos planos privados ao SUS está previsto em lei, mas a Confederação Nacional de Saúde (CNS), que reúne hospitais e operadoras, ingressou com ação junto ao STF questionando a cobrança.
A decisão tomada pelo STF nesta quarta-feira (7) põe fim à controvérsia, obrigando os demais tribunais a seguirem o entendimento. O STF também validou a lei que obriga os planos de saúde a informar aos clientes sobre os motivos de atendimentos terem sido negados.
Por unanimidade, os 9 ministros que participaram do julgamento rejeitaram o pedido para impedir o ressarcimento. Relator da ação, o ministro Marco Aurélio Mello argumentou que o contrato do plano de saúde o obriga a pagar pelo atendimento, não importa se na rede privada ou pública.
“A norma impede o enriquecimento ilícito das empresas e perpetuação da lógica do lucro às custas do erário. Entendimento contrário significa que os planos de saúde recebem pagamento, mas serviços continuam a ser prestados pelo Estado, sem contrapartida”, afirmou o ministro no voto.
Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes acrescentou que as pessoas só procuram a rede pública quando os planos falham em prestar o atendimento.
“Quem procurou o plano de saúde privado, é porque não está contente com a saúde pública. Se você paga mensalmente o plano de saúde, já optou. Só vai procurar o SUS quando seu plano falhou. Ou não deu a cobertura que deveria dar ou deu cobertura abaixo do que se pretendia”, disse.
Além de Marco Aurélio e Alexandre de Moraes, votaram em favor do ressarcimento os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Cármen Lúcia. Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso não participaram do julgamento.
Quando uma pessoa que possui plano de saúde é enviada para fazer qualquer procedimento na rede pública (como uma consulta ou uma cirurgia), o plano é obrigado a pagar ao governo pelo procedimento. Os valores de cada serviço são tabelados e são definidos pelo próprio SUS.
Essa tabela é atualizada periodicamente. Uma tomografia dos seios da face (usada para diagnosticar uma sinusite, por exemplo) sai por R$ 86. Já uma cirurgia cardíaca para correção de problemas na válvula mitral (que separa os dois lados do coração) está tabelada em R$ 7,7 mil.
O SUS é hoje responsável pela maioria dos transplantes de órgãos, por exemplo. Também faz quase todos os tratamentos de doenças infecciosas, como a hanseníase, entre muitos outros.
A maioria dos estabelecimentos que oferecem esses tratamentos são públicos ou conveniados ao SUS. E é por isso que muitas pessoas que têm planos de saúde são encaminhados para o atendimento público, diz a professora do Departamento de Saúde Coletiva da Universidade de Brasília (UnB) Helena Eri Shimizu.
O sistema funciona assim: a ANS compara a base de dados dos brasileiros que possuem planos de saúde com o registro de quem foi atendido pelo SUS. Quando encontra uma correspondência, envia a cobrança à operadora.
“A forma como isso é feito hoje é pouco eficaz, e abre margem para que as operadoras contestem na Justiça os procedimentos, além de deixar alguns atendimentos de fora. Então o valor que poderia ser arrecadado poderia ser ainda maior”, diz Shimizu.
Uma decisão com efeito cascata
De acordo com os últimos dados da ANS, os planos contestam na Justiça o pagamento de R$ 4,99 bilhões em procedimentos realizados entre 2000 e 2017.
Esse dinheiro – que não chegou a ser cobrado – depende de decisões judiciais nas instâncias inferiores da Justiça. Com a decisão do Supremo, as operadoras devem ser derrotadas nestes processos.
“Entre 2000 e 2017 foram identificados 4,51 milhões de atendimentos no SUS de usuários de planos de saúde passíveis de ressarcimento, totalizando R$ 7,5 bilhões. Desse total, apenas R$ 1,9 bilhão foram repassados ao Fundo Nacional de Saúde (responsável pelo SUS)”, disse o Ministério da Saúde em nota enviada à BBC Brasil.
“O Ministério da Saúde informa que a extinção da obrigatoriedade do ressarcimento ao SUS pelos planos de saúde pode causar grandes perdas ao sistema. Levantamento feito pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) estima que a decisão pode acarretar uma perda imediata de R$ 5,6 bilhões)”, diz o ministério.
Da redação com agências
Publicado em 08/02/2018