A Fiocruz diante da covid-19, entrevista com Nísia Trindade

Mal atende o telefone, Nísia Trindade Lima avisa, com delicadeza, que precisará atrasar a entrevista em dez minutos porque recebeu um chamado do Ministério da Saúde. Seus dias têm sido assim desde que os casos da covid-19 passaram a se multiplicar no Brasil. São reuniões virtuais consecutivas, isolamento social até dos filhos e imensas e incontáveis responsabilidades como presidente da Fiocruz. É a primeira mulher no cargo nos 120 anos, completados em maio, da instituição que está no centro do combate à pandemia no país.

 

 

“É duro, é difícil, mas o tempo todo estou trabalhando, e isso nos dá esse sentido de urgência e da importância de estarmos dedicados a esse objetivo”. Comparo-a ao general Patton em meio à Segunda Guerra, mas Nísia discorda: “Fala-se muito de guerra, não gosto dessa metáfora. Para mim, a imagem que expressa essa pandemia é uma crise sanitária e humanitária”. A desigualdade brasileira em meio a esse “desastre” é uma das maiores preocupações da socióloga. “Não há democracia na circulação do vírus. Falam que o vírus é democrático, e ele pode, de fato, atingir a todos, como atinge, mas a capacidade de proteção e de resposta a isso é diferente num país desigual como o nosso”, diz ela, referindo-se aos milhões de brasileiros sem acesso à água e impossibilitados de evitar aglomerações.

Nesta entrevista exclusiva à Ciência Hoje, que reproduzidmos aqui, Nísia fala da importância do Sistema Único de Saúde, de como criar condições para quando uma vacina chegar estar disponível a todos e da iniquidade de gênero dentro da própria Fiocruz.

Quando a Fiocruz foi criada, há 120 anos, as ameaças eram as epidemias de varíola, peste bubônica e febre amarela. Hoje, a instituição segue como referência para combater epidemias e está no centro do enfrentamento da covid-19. Pode falar um pouco dessa trajetória?
NÍSIA TRINDADE LIMA:
 A história do século 20 em relação à saúde pública, e até numa visão mais profunda do Brasil, passa pela Fiocruz. E por quê? O trabalho científico realizado na instituição se volta aos grandes problemas, epidemias urbanas de peste bubônica, varíola e febre amarela, além de outros problemas como as chamadas doenças dos sertões, a Doença de Chagas, marcante na trajetória da instituição. É possível pensar a própria história da sociedade brasileira por esse ângulo da saúde pública, porque a expansão de projetos vistos como modernizadores no território brasileiro sempre colocou questões ambientais, de qualidade de vida, da emergência de doença… E a Fiocruz representa essa história, sempre trazendo aportes científicos dos seus pesquisadores, associando a ciência às necessidades da saúde pública. Neste momento, estamos enfrentando a grande pandemia do século 21, algo que também vai além da saúde. É um grande desafio para uma instituição de ciência e tecnologia vinculada ao Ministério da Saúde (MS) e que, ao longo de sua trajetória, participou do movimento da reforma sanitária na Constituição de 1988, da criação do Sistema Único de Saúde (SUS) e busca unir esse esforço de ciência, tecnologia e inovação com a constituição de um sistema universal em um país continental e extremamente desigual. Se fizermos um paralelo em termos de pandemia, é importante lembrar que cientistas da saúde pública, como Carlos Seidel e Carlos Chagas, foram personagens chave na organização de ações de mitigação da Gripe Espanhola no início do século 20. Então é uma tradição que se atualiza hoje, com uma instituição que se espraia de Manguinhos, onde tudo começou, por todas as regiões brasileiras, com presença de institutos e escritórios em dez estados, e trabalhando toda a cadeia, do conhecimento até a produção.

Quais lições podemos aprender com o combate às epidemias do passado na atual crise?
NTL: Muitos falam que a perspectiva histórica nos ajuda a entender melhor o presente e os desafios que temos. Por outro lado, é difícil tirar lições do passado. Dizem que é como tentar mirar o futuro com um retrovisor. Mas é possível falar de alguns aprendizados e legados. O mais importante é a necessidade de o país ter uma ciência forte e instituições científicas e universitárias onde se possa gerar conhecimento para compreender a dinâmica da doença na relação com a sociedade e o ambiente e também apoiar o desenvolvimento de políticas públicas. O país precisa fortalecer sua base cientifica e tecnológica. Neste momento vemos, de uma maneira muito triste, que muitos insumos de saúde, como equipamento de produção individual (EPI) e respiradores, não estão acessíveis e isso independe do poder de compra, porque dependemos de importações de produtos que agora estão escassos. É importante ter um desenvolvimento industrial que permita ao país sua autonomia e impulsionar o desenvolvimento em outras áreas. Esses são os principais aprendizados: a importância de se investir em ciência e tecnologia e associá-las ao que chamamos de complexo econômico e industrial da saúde. O SUS requer inovação e tecnologia, requer uma base produtiva.

A ciência tem ocupado um lugar central no combate à pandemia, no momento em que muitos movimentos anticientíficos buscam diminuir sua relevância. De que maneira a relação ciência e sociedade vai se estruturar após a atual situação?
Podemos ter esperança, mas não convicção absoluta de que o valor social da ciência venha a ser mais respeitado e fortalecido nesse processo. Cabe à ciência – nesse sentido amplo, em todas as áreas do conhecimento – dar as respostas e informar políticas públicas para proteger a sociedade. Essa é a aposta muito importante que nós temos, mas nada disso é dado. E aí entra a política com ‘P’ maiúsculo. Não podemos apenas fazer esse enunciado da importância da ciência e não trabalharmos cotidianamente para essa construção coletiva. Precisaremos de um pacto pela vida, como bem coloca a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência na Marcha Virtual pela Ciência.

Você é autora do livro Louis Pasteur e Oswaldo Cruz: tradição e inovação em saúde. Por que se valoriza tanto a figura de Oswaldo Cruz, mas não se tem a mesma visão dos cientistas no Brasil contemporâneo?
São várias razões. Oswaldo Cruz se tornou um símbolo, assim como o castelo de Manguinhos simboliza a possibilidade de fazer pesquisa científica de alto nível num país de periferia e, sobretudo, uma ciência cujos resultados são mais visíveis à população. Talvez menos visível, mas quem sabe até mais importante, foi o fato de ele ter formado uma escola. Ou seja: sua memória, seu trabalho foi sendo atualizado por gerações de pesquisadores, entre os quais me incluo. Assim essa matriz histórica é permanentemente atualizada e tem o Oswaldo Cruz como pioneiro e referência maior. Outro fator é que a ciência era feita de uma forma diferente. Hoje em dia, cada vez mais, coletivos e grandes equipes são importantes, e, ainda que as lideranças continuem a pesar, essa figura individualizada do cientista já não existe da mesma forma. E um terceiro aspecto não menos importante é que a ciência no Brasil se democratizou, eram pouquíssimos cientistas no Brasil no início do século 20. Hoje temos muito mais pesquisadores e em todas as regiões do Brasil. Temos também a ideia de ciência cidadã, com a participação ativa da população na construção do conhecimento científico. A base científica se ampliou, e é essa base que precisa ser preservada neste momento. A figura de Oswaldo Cruz permanece na medida em que essa ciência vai se reproduzindo. Se não, ele vai virar um símbolo de um passado longínquo, e isso nós não podemos admitir.

E o hospital de campanha? Além de tratamento dos pacientes, auxiliará nas pesquisas em andamento?
Não estamos chamando nosso centro hospitalar de hospital de campanha porque ele terá uma permanência, como uma ampliação das ações do nosso Instituto Nacional de Infectologia, que já carecia de melhor estrutura para o atendimento de pacientes graves. O hospital é um dos que vão fazer parte desse grande estudo clínico Solidariedade, da Organização Mundial da Saúde (OMS), que está analisando medicamentos já conhecidos para avaliar sua eficácia e sua segurança quando administrados a pacientes da covid-19. Ele vai permitir também, como vai ser um complexo com um grande número de leitos, uma revisão de protocolos, um conhecimento mais amplo das características da doença em sua forma grave no Brasil. Será também um grande laboratório de estudo do comportamento dessa doença nas pessoas com a manifestação mais grave.

Por que a Fiocruz foi considerada referência para a covid-19 nas Américas pela OMS?
Esse é um reconhecimento ao Laboratório de Vírus Respiratórios e Sarampo, que tem mais de 60 anos de atividade e a história marcada pela resposta à epidemia de meningite na década de 1970. Esse reconhecimento da OMS significa que o diagnóstico do vírus, e também o estudo de suas mutações – e aí o Brasil é um grande laboratório –, será feito em todas as Américas tendo como referência o nosso laboratório.

Um dos compromissos de seu programa de gestão é defender o direito à saúde universal e o SUS. Como o sistema está enfrentando a covid-19?
A pandemia, pela velocidade de transmissão e pelos casos graves que requererem longos períodos internação e atenção especializada de alto custo, é um problema para todos os sistemas do mundo, até mesmo no inglês, que é robusto. Por outro lado, vemos os Estados Unidos, uma nação rica, mas que enfrenta com dificuldade a pandemia por não ter um sistema público. Então é importante acentuar que o SUS, neste momento, é uma fortaleza, mas também adoece, porque há outros problemas a serem enfrentados. Teríamos problemas em qualquer situação como o mundo todo, mas soma-se a isso um subfinanciamento histórico. O legado dessa pandemia é que esse sistema precisa ser fortalecido. E a estratégia da saúde da família e da atenção básica, que cresceu no início do século 21, também requer um olhar especial, porque tem proximidade nos territórios. Outro ponto no enfrentamento da pandemia é a extrema desigualdade no Brasil, que implica condições de vida sem saneamento, sem água, o que torna as medidas de higienização muito difíceis de serem implementadas. O mesmo se diz em relação ao isolamento. Além das medidas de saúde e fortalecimento da assistência, tem que se trabalhar medidas de proteção social. As pessoas não podem, ao escapar da covid-19, morrerem de fome.

Como é ser a primeira mulher presidente da Fiocruz em 120 anos e estar no centro do enfrentamento dessa crise só comparável à Gripe Espanhola?
Essa é uma crise planetária, que coloca em xeque o modelo civilizatório, expõe a vulnerabilidade do mundo todo. É um desafio impensável para a minha geração, que participou da construção do SUS, da retomada do processo democrático no país. Meu papel é coordenar esforços da potência que é a Fiocruz, a principal instituição de Ciência e Tecnologia em Saúde da América Latina, fazendo com que atue como um sistema de forma sinérgica. Lidamos com essa pandemia como uma grande crise sanitária e humanitária multidimensional, que requer conhecimento de todas as áreas da ciência. Salvar vidas, fortalecer o nosso SUS e ter uma agenda para um processo que vai se alongar, lutar por uma vacina e garantir o acesso de toda a população à vacina e a outros meios para proteger sua saúde, esses são os grandes desafios.

Como primeira mulher a presidir a Fiocruz, enfrento esse desafio com sentimento ambíguo. Tenho me esforçado para reforçar o nosso Comitê de Equidade e Gênero em torno de uma série de questões, mas destaco uma: mulheres são maioria entre nossos trabalhadores e pesquisadores, mas minoria nos cargos diretivos. Que a minha posição na presidência não sirva só como um exemplo, mas como um motor de reduzir essa iniquidade. E eu falo de um sentimento ambíguo porque, neste momento da pandemia, eu vejo várias colegas na linha de frente. Isso dá orgulho. Por outro lado, essa pandemia revela uma sociedade muito desigual, e essa desigualdade também se expressa entre os trabalhadores da saúde. Temos visto adoecimento dos profissionais e incidindo de uma maneira muito intensa sobre a enfermagem, e, nesta categoria profissional, a maioria é de mulheres. Vemos também aumentar a violência contra as mulheres, num momento que era para estarmos defendendo, como parte do pacto pela vida, um pacto pela paz e por relações sociais de respeito a direitos humanos, dignidade e respeito às diferenças.

As ciências sociais têm sido deixadas em segundo plano nos investimentos do atual governo. Como socióloga, qual a importância das ciências sociais nessa pandemia?
As ciências sociais são importantes em várias áreas, mas, falando especificamente das emergências sanitárias, são fundamentais para pensarmos a dinâmica da circulação de um vírus e seu impacto na sociedade. Além disso, as ciências sociais trabalham com a percepção sobre risco, com as políticas públicas. É impossível enfrentar uma pandemia sem esses recursos. As ciências sociais é que vão permitir que entendamos, por exemplo, que medidas e que comunicação vão ser, de fato, eficientes numa sociedade tão desigual como a nossa. Como mostrou o sociólogo Norbert Elias em O processo civilizador, muitos hábitos que desenvolvemos têm a ver com diferenciação de classe, e esse trabalho foi uma referência importante para estudos sobre as epidemias. Há uma dimensão social muito importante quando falamos que todos podem pegar a doença, mas, ao mesmo tempo, são proteções diferentes de acordo com relações sociais e de poder desiguais. Se ainda tivéssemos entre nós um historiador como Eric Hobsbawn, ele talvez dissesse que o século 21 está começando agora, porque a pandemia vai botar em xeque essa circulação de pessoas e de mercadorias do mundo dito globalizado. Vai evidenciar também as diferenças entre os países com mais e menos condições de proteção e que a proteção depende também de um forte arranjo de política pública do Estado e de uma forte solidariedade social. Tudo isso é sociologia.

Cientistas ligados a Fiocruz de Manaus, entre outros, foram ameaçados por conta das pesquisas que conduzem. Como vê essa situação de coerção da pesquisa e busca de cerceamento do livre pensar por certos grupos sociais?
A ciência só pode existir com liberdade e ética, são dois princípios básicos. Não quer dizer que os cientistas podem fazer tudo o que querem, por isso, temos comitês de ética que se fortaleceram muito no Brasil. No caso específico que você cita, a minha posição é a que está na nota do nosso conselho deliberativo.

Fonte: Ciência Hoje
Publicado em 18/05/2020

STF deu um tiro de morte em TODAS as negociações coletivas de 2017

Imagine um mundo em que os patrões possam revogar todos os benefícios concedidos a seus funcionários sem discussão, sem direito à intervenção da Justiça do Trabalho. Vale-alimentação, seguro de saúde, estabilidade pré-aposentadoria – tudo o que for negociado pode ir pela janela. Esse cenário opressivo pode se tornar nossa realidade a partir de 2017, graças a um conjunto de ações do STF que chegaram ao ápice na última quinta-feira (24).

 

Trata-se das consequências de três ações diferentes, tramitando ao mesmo tempo: as ADIs 2200 e 2288, que tentam interligar os contratos coletivos de trabalho com os individuais, e a ADPF 323, que quer contrariar o Tribunal Superior do Trabalho em seu entendimento dos tais contratos. Nos três casos, diferentes ministros decidiram por acabar com a continuidade desses acordos depois de seus prazos-limite, mesmo que o patrão se recuse a assinar outro.

Com isso, deram um tiro de morte na capacidade de barganha dos trabalhadores a partir de 2017.

“Ultratividade”: combinado não sai caro

O que se discute, no fundo, é a “ultratividade” das convenções coletivas – isto é, a continuidade dos acordos até que se negocie outro. Isso é um incômodo para os empresários brasileiros, pois os obriga a ir à mesa com seus funcionários. Enquanto não houver data de validade para os contratos firmados entre sindicatos e patrões, a única forma de alterá-los é negociando a partir das concessões anteriores. O vídeo abaixo ajuda a entender:

O presidente do Sindicato dos Bancários da Bahia, Augusto Vasconcelos, explica o pode mudar: “Se essa regra deixar de existir, basta que as empresas se recusem a renovar acordos já firmados e os direitos ali contidos deixarão de existir. A cada campanha salarial, teremos de lutar para renovar cláusulas que já foram conquistadas anteriormente, aumentando ainda mais a desigualdade nas negociações”.

Em um cenário ainda pior, o lado contratante poderá simplesmente esperar o fim do prazo dos acordos de forma proposital, forçando os trabalhadores a ceder vitórias anteriores para retomar as conversas. De quebra, ainda se verá livre de todas as obrigações extras enquanto não for firmado um novo contrato – algo que reduzirá de forma dramática o limite de concessões.

O aspecto mais ardiloso é que, mesmo diante de uma desonestidade negocial como essa, os sindicatos não poderão pedir a arbitragem da Justiça do Trabalho, já que o dissídio coletivo só pode ser iniciado quando há participação dos dois lados. O Poder Judiciário teria que assistir impotente até que o patrão convidasse à mesa a Justiça do Trabalho – uma instância historicamente pró-trabalhador. Melhor esperar sentado.

O caso das ADIs

Dentre os três processos que correm sobre o tema, as ADIs 2200 e 2288 foram propostas pelo PCdoB e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transportes Aquaviário (CONTTMAF) com conteúdo similar, para tentar impedir a dissociação entre os contratos coletivos e individuais de trabalho. São tão parecidas que correm em julgamento conjunto. O argumento central, de que as cláusulas coletivas deveriam ser integradas aos contratos permanentes de cada trabalhador, só foi aceito pelo ministro Edson Fachin, que lembrou que a própria Constituição estende a proteção dos direitos trabalhistas às convenções coletivas (está no artigo 114, §2º).

Do outro lado, o processo já foi julgado de forma desfavorável por Cármen Lúcia, Luís Roberto Barroso, Teori Zavascki e Marco Aurélio de Mello. Na última quinta-feira (25), a ministra Rosa Weber paralisou o julgamento com um pedido de vistas, mas há pouca chance de reversão a essa altura do campeonato.

Esse pessimismo tem nome e sobrenome: Gilmar Mendes. Além de ter o voto mais reacionário de todo o STF, o ministro tem dado muitas declarações de contrariedade às causas dos trabalhadores. Chegou a comparar a Justiça do Trabalho a “um tribunal soviético” em um episódio recente, causando furor entre os juízes trabalhistas, e não faz segredo de que votará contra as ADIs. Daí restará apenas um voto para a perda da causa.

A bomba plantada por Gilmar Mendes

Resta, enfim, a ADPF 323, que tornou-se o olho do furacão ao cair nas mãos de Gilmar Mendes. Proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen), a ação busca reverter a Súmula 277 do Tribunal Superior do Trabalho, que torna infinito o prazo das negociações coletivas.

Se for vitoriosa, a ação acabará com a ultratividade dos acordos, fazendo-os durar por no máximo dois anos. Se nada aparecer no lugar, somem os direitos.

A grande surpresa deste caso é que, logo na largada, Gilmar Mendes concedeu uma decisão liminar que suspende os efeitos da Súmula 277 para TODAS AS CONVENÇÕES do Brasil. De um dia para outro, surgiu um buraco negro nas leis trabalhistas.

“Decisão do STF é mais um ataque aos direitos trabalhistas”, afirma assessor jurídico da CTB

“A primeira consequência desta decisão é a perda da data-base das categorias”, enfatizou Hélio Gherardi, advogado do corpo técnico do Diap. Ele explica que, se não houver o “comum acordo” para a intervenção da Justiça do Trabalho, os trabalhadores não poderão fazer nada para reaver suas perdas nos períodos de negociação. As negociações precisarão ser apressadas para reduzir a defasagem. “Sem ultratividade, a negociação coletiva será precarizada. Não haverá negociação coletiva plena”, lamentou o senador Paulo Paim (PT-RS).

Um dos aspectos mais escandalizantes da decisão de Gilmar é que ela atropela anos de prática jurídica consolidada. Em sua liminar de 57 páginas, o ministro ignora a consistência das decisões em prol da ultratividade das convenções, partindo para uma argumentação que é mais política do que jurídica. Sua linha de fundo é simples: “os trabalhadores são hiperprotegidos”, “não há equilíbrio nas negociações”. Sob a camada de juridiquês, esconde-se um ressentimento palpável contra a Justiça do Trabalho – que ele afirma trabalhar para “dificultar as negociações”.

Gilmar se permite um grau de chacota inédito. A fundamentação que constrói reforça a ideia de que os juízes do trabalho são uma “fraude”, fazem um trabalho “ingênuo” e uma “proeza digna de figurar no Guiness Book” pelo “ineditismo jurídico” que praticam. Na visão magnânima de Mendes, sua decisão encerrará o “zigue zague jurídico” sobre o tema.

A luta não acabou

Entre essa decisão e outras anteriores, como a proibição da desaposentação e a retirada de proteções durante a greve dos servidores do Rio, o STF tem demonstrado uma cooperação perniciosa com Michel Temer. O golpista em pessoa chegou a dizer, em setembro, que já contava com a conivência togada para sua reforma trabalhista: “Ela já está sendo feita de alguma maneira pelos próprios tribunais”.

Está ficando impossível fingir que o Brasil não vive um Estado de Exceção

Felizmente, a liminar de Mendes é passível de reversão pelo plenário do STF – algo que deve acontecer, considerando o caráter abertamente ideológico da decisão. Para isso, porém, cabe à presidenta Carmen Lúcia pautar o julgamento principal da ADPF 323, e não há qualquer calendário publicado nesse sentido.

Importante notar que, ainda que a liminar caia, a suspensão não terá efeito retroativo sobre os danos causados durante sua vigência. Com o recesso do Supremo previsto para daqui a duas semanas, há pouco tempo para impedir que essa sombra jurídica chegue a 2017.

É preciso agir rápido. Se este caso virar o ano, dará espaço para a suspensão de benefícios das categorias cujas convenções coletivas vencem já no primeiro trimestre. Todas as consequências do fim da ultratividade poderão ser postas em prática imediatamente.

Fonte: CTB, por Renato Bazan

Temer manobra e desenterra PL que institui terceirização plena; projeto liquida com direitos

Em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselhão, realizada nesta segunda-feira (21), em Brasília, o presidente Michel Temer, arregimentou apoio para o projeto de lei 4.302 de 1998, que abre espaço para a terceirização plena e garante segurança jurídica para as empresas que adotarem a modalidade de trabalho temporário.

A proposta, que deve ser votada ainda nesta semana na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, além de abrir para a terceirização irrestrita atingirá também o Serviço Público.

Ao criticar a manobra de Temer para avançar com a proposta da terceirização, o presidente da CTB, Adilson Araújo, afirmou que o que se quer é “a liquidação total dos direitos”.

“A terceirização é uma parte da reforma trabalhista que liquida direitos consagrados da classe trabalhadora e blinda os empresários. É bom lembrar que, tanto o PLC 030 como o PL 4203, são demandas dos setores da indústria e do comércio”, alertou o dirigente nacional ao denunciar o empenho do setor empresarial pela aprovação de propostas dessa natureza.

Araújo ainda destacou que por trás do discurso da “desburocratização” e da “ampliação do número de postos de trabalho” se esconde uma proposta que abre espaço para a precarização geral do mundo do trabalho.

Campanha pela precarização da CNI

No mesmo dia em que Oliveira protocolou parecer favorável pela aprovação do PL 4203, a Confederação Nacional das Indústrias (CNI) soltou nota, em boletim especial, apoiando a proposta que abre espaço para a precarização do mundo do trabalho.

De acordo com a nota, a CNI sai na defesa da responsabilidade subsidiária como regra, e a inexistência de limite para terceirização. E mais, ao se posicionar sobre a diferenciação da atividade-meio e atividade-fim, a Confederação subscreveu o parecer: “Qualquer regulamentação, portanto, dispensa este tipo de esclarecimento e deve deixar autorização plena para as empresas contratarem serviços vinculados a sua atividade de forma ampla, prezando pela clareza e pela preservação máxima da livre iniciativa, protegendo o atual exercício das atividades das empresas, que demanda a formação de redes de produção, uso intensivo de tecnologia da informação, e ganhos de produtividade”.

E emendou: “Eventual diferenciação entre atividade-fim e atividade-meio mostra-se um empecilho, pois as empresas da atualidade trabalham em redes de produção e, por isso, precisam contratar de tudo…”.

Tramitação do PL 4203

O atual relator da proposta que sepulta os direitos da classe trabalhadora é o deputado Laércio Oliveira (SD-SE). Na quinta-feira (17) ele apresentou relatório favorável ao substitutivo elaborado no Senado.

A proposta já foi votada pela Câmara dos Deputados, em 2000, e pelo Senado, em 2002. Como passou por mudanças substanciais na 2ª etapa, o texto voltou à Câmara.

Os deputados analisam, agora, se concordam com a nova redação dada no Senado. Em caso positivo, segue para sanção como está. Se for rejeitado, chega ao Planalto da maneira como foi aprovado pela Câmara em 2000.

Terceirização plena

Em seu parecer, o relator do projeto defendeu a “terceirização plena”. O que isso significa? “Qualquer coisa pode ser terceirizada”, afirma.

Oliveira criticou o projeto de lei da terceirização que está atualmente no Senado. Segundo ele, a proposta [PLC 030] é “muito ruim” e “sofreu muitas alterações que prejudicaram o texto”.

Após a reunião do Conselhão, o Planalto indicou que o PL 4302 é a melhor proposta para avançar na pauta da terceirização. O PLC 030, que está no Senado, não deve ser levado à frente pelo governo.

O que se desenha é a defesa de uma proposta ainda pior que o PLC 030, que associada às demais propostas de Temer, enterrará direitos e eliminará qualquer horizonte de retomada de desenvolvimento com geração de emprego decente, inclusão social e distribuição de renda.

Fonte: CTB

Covid-19: Para não deixar morrer, fila única de leitos

Saúde privada, fortemente subsidiada pelo Estado, tem leitos desocupados. Enquanto isso, Ceará e diversas capitais já ocupam totalidade de UTIs públicas. População morre na espera por atendimento. Evitar colapso exige requisitar hospitais particulares.

 

 

 

Por Cátia Guimarẽs, na EPSJV/Fiocruz

 

O sistema é único, mas, na vida real, tem gente que usa o serviço público e tem quem pague por um serviço privado. O sistema é público, mas um volume considerável de renúncia fiscal do Estado ajuda a manter a clientela dos planos de saúde, que se resume a menos de 25% da população. O sistema é universal, mas no momento em que a pandemia gerou uma corrida às Unidades de Terapia Intensiva (UTI), cresce o número de pessoas que morrem em casa, sem atendimento, mesmo quando hospitais particulares da região ainda têm leitos desocupados. É verdade que essas contradições são muito mais antigas do que a Covid-19. Elas nasceram exatamente no momento em que a Constituição Federal estabeleceu, por um lado, que saúde é direito de todos e dever do Estado e, por outro, que as instituições privadas poderiam participar “de forma complementar” do Sistema Único de Saúde, o SUS, que acabava de ser criado.

Trinta e dois anos depois, em meio à crise sanitária causada pela pandemia de coronavírus, o país se deparou com um retrato alarmante daquilo que foi concebido apenas como um ‘complemento’: em todo o Brasil, enquanto o SUS tem cerca de 13,6 leitos de UTI disponíveis para cada 100 mil habitantes, no setor privado esse número sobre para 62,6, de acordo com uma nota técnica produzida pelos pesquisadores Nilson do Rosário, da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (ENSP/Fiocruz) e Marcos Junqueira, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Em comunicado de março deste ano, a Associação de Medicina Intensiva Brasileira (Amib) informava uma relação de 14 leitos públicos para 49 privados. De todo modo, ao cenário mais farto, podem ter acesso 47 milhões de pessoas, usuários de planos de saúde. Já as filas do lado mais carente estão destinadas a 162 milhões de brasileiros, que dependem exclusivamente do SUS.  E essas diferenças se mantêm quando se olham os dados discriminados. De acordo com o levantamento, o estado com menos leitos públicos de UTI em relação à população é o Amapá: são apenas sete por 100 mil habitantes, contra 97 privados. Na outra ponta, está o Paraná, com 24 leitos SUS e 38 privados. O Amapá é também o único estado brasileiro em que nenhum município dispõe de leitos de UTI e equipamentos necessários neste momento, como respiradores, desfibriladores e tomógrafos, de acordo com outra nota técnica, intitulada ‘Limites e possibilidades dos municípios brasileiros para o enfrentamento dos casos graves de Covid-19’, produzida por Margareth Portela, também da ENSP/Fiocruz, junto com outros cinco pesquisadores. “A situação de desigualdade que temos no Brasil se reflete, obviamente, no nosso sistema de saúde”, resume Leonardo Mattos, um dos coordenadores da campanha ‘Leito para Todos’.

Não fosse o colapso dos sistemas de saúde de várias cidades que já têm todos os leitos públicos de UTI ocupados e continuam somando filas de doentes de Covid-19 em estado grave, talvez essas diferenças passassem despercebidas. Mas no momento em que esta reportagem foi finalizada, municípios como São Luiz e até um estado inteiro, como o Ceará, tinham 100% dos leitos públicos de UTI ocupados ou estavam próximos disso, como é o caso de Pernambuco. O Rio de Janeiro, que já tem fila de pacientes graves de Covid-19 sem UTI, chegou a produzir um protocolo para definir quem teria prioridade de acesso aos leitos de terapia intensiva. Diante dessa medida drástica, houve reação. Em nota, o Sindicato dos Médicos do município argumentou que a “escolha pela Medicina Paliativa” está relacionada a doenças para as quais não existe tratamento e cura, especialmente os casos de câncer, e ressalta que esse “não é o caso da Covid-19”. Falando especificamente sobre a cidade do Rio, o texto faz referência à existência de leitos vazios, tanto em hospitais privados quanto nos federais. “A seriedade do quadro epidemiológico não demanda gestores paliativos: requer decisões difíceis e a mobilização plena dos recursos em defesa da vida”, diz a nota, que completa: “Em calamidade, ninguém deve morrer enquanto não se esgotam os recursos disponíveis”.

E que recursos são esses?

Em números absolutos, a diferença entre público e privado nem é tão grande. De acordo com o levantamento feito pela Amib, em março deste ano, o país tinha 45,8 mil leitos de UTI, sendo 22,8 mil no SUS e 23 mil na rede particular. Somado, esse quantitativo é considerado “satisfatório” pela entidade. Mas quando se divide cada uma dessas partes pelo contingente da população que pode usufruir do serviço, identifica-se que um brasileiro com plano de saúde tem mais do triplo de chance de ter acesso a uma UTI neste momento do que os outros cerca de 77% da população que dependem exclusivamente do SUS. Os leitos disponíveis para o SUS encontram-se em hospitais públicos e conveniados, que são privados mas, em geral, classificados como filantrópicos.

A saturação do sistema de saúde que hoje algumas cidades começam a apresentar já era prevista em março, quando o estudo de Rosário e Junqueira simulou dois cenários distintos. No mais otimista, ele avalia a condição das redes em todos os estados considerando que, antes da epidemia, 50% desses leitos estavam ocupados. O mais pessimista – que leva em conta informação de documentos oficiais divulgados pelo site The Intercept em dezembro de 2019 – supõe uma ocupação prévia de 85%. No primeiro caso, 11 estados teriam disponíveis dez ou mais leitos por 100 mil habitantes. “Na prática, 68% da população brasileira residiam em um Estado da federação na condição crítica na disponibilidade de leitos de UTI em dezembro de 2019, mesmo usando parâmetros extremamente benevolentes para a taxa de ocupação”, diz o texto. Quando considerada a taxa de 85% de ocupação prévia no SUS, “todos os estados se encontravam completamente colapsados”. Isso, claro, contando-se apenas a disponibilidade de leitos do SUS. Agrava ainda mais a situação o fato de o tempo de permanência dos pacientes de Covid-19 na UTI – pelo menos 14 dias – ser bem superior à média que, segundo a Amib, é de 6,5 dias.

Fila única?

Foi prevendo que isso aconteceria que, ainda em março, um grupo de mais de 40 entidades, entre elas a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), o Centro Brasileiro de Estudos em Saúde (Cebes) e a Frente Nacional Contra a Privatização da Saúde, além de centenas de pessoas, incluindo três ex-ministros da saúde – Alexandre Padilha, José Gomes Temporão e José Saraiva Felipe – lançou um manifesto que reivindica a unificação das filas dos hospitais públicos e privados, sob gestão do Estado. Chamada ‘Leitos para Todos’, a campanha defende que “para enfrentar esta dramática e urgente situação, o poder público precisa tomar atitudes muito mais enfáticas para garantir atenção a todos os casos, independente da capacidade de pagamento”.

E essas não são vozes isoladas. No último dia 22 de abril, o Conselho Nacional de Saúde, instância máxima de controle social do SUS, emitiu uma recomendação ao Ministério e Secretarias estaduais e municipais de saúde para que seja criada uma fila única de leitos no país durante o enfrentamento da pandemia. Muito antes, já tinha sido apresentada ao Supremo Tribunal Federal (STF) uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), de nº 671, que também pede que o poder público passe a regular os leitos de UTI da rede privada, mas foi rejeitada. “Não é nada absurdo. Foi feito em diversos países europeus, como Irlanda, Espanha, Itália e outros que passaram por situação parecida com a do Brasil. Esses países unificaram toda a capacidade pública e privada para atender a todos. E é isso que a gente está propondo fazer aqui”, explica Leonardo Mattos. Ele reforça ainda que essa iniciativa tem respaldo legal, tanto na Constituição Federal quanto na Lei Orgânica da Saúde (nº 8.080) e na recente Lei de Calamidade Pública, aprovada já no contexto da Covid-19. Em todos esses casos, o uso dos leitos privados seria remunerado pelo Estado.

De acordo com Mattos, se tomada agora, essa medida ampliaria a capacidade de resposta do sistema de saúde como um todo num momento em que os hospitais de campanha que estão sendo construídos para ampliar as vagas ainda não estão em funcionamento. E ele alerta que esse processo dos novos hospitais é mais complexo do que parece porque vai além da construção física, demandando, por exemplo, equipamentos de proteção individual e respiradores, que continuam em falta no país, sem contar a contratação de profissionais. “Já temos em diversos locais no Brasil sistemas de saúde que estão lotados, os leitos de UTI já estão esgotados, as pessoas estão tendo que morrer em casa. Essa é uma situação muito dramática”, alerta. E completa: “Na medida em que os governos se omitem de tomar essa decisão, eles estão assumindo que algumas vidas valem mais do que outras, que algumas vidas são descartáveis enquanto outras podem ter sua capacidade de atendimento preservada”.

A reportagem perguntou à Associação Nacional dos Hospitais Privados (Anahp) sobre sua posição em relação a essa proposta. A resposta, enviada em nota via assessoria de imprensa, foi que a entidade “reforça a importância do isolamento social e a necessidade de uma ação planejada e alinhada entre os setores público e privado, levando em consideração a evolução do surto e a demanda em relação à capacidade dos sistemas de cada local, haja visto que há cidades e estados mais acometidos pela doença, enquanto outros tiveram poucos ou não registraram casos”. A associação reafirma ainda “seu compromisso em contribuir para o enfrentamento da Covid-19 e informa que está em contato ativo e frequente com o governo para buscar soluções de forma ágil e objetiva, como o cenário atual requer”, mas não faz qualquer referência direta à proposta da campanha.

Informação privada

A Anahp vem sendo citada como fonte de reportagens recentes que trazem dados de ocupação de UTI especificamente no Rio de Janeiro, onde 80% desses leitos da rede privada também já estariam ocupados. Na nota enviada à reportagem, a entidade atualiza esse número para cerca de 90%, explicando que chegou a esse dado por meio de um “levantamento pontual” feito especificamente com 14 hospitais do estado. O texto não apresenta informação sobre nenhuma outra cidade ou estado mas, em comunicado publicado em fevereiro deste ano, outra associação, a Amib, afirmou que cerca de 80% dos leitos de UTI na saúde suplementar no Brasil estavam ocupados. “A gente nem sabe se isso é verdade porque não existe informação pública sobre isso”, questiona Leonardo Mattos.

De fato, os dados sobre ocupação dos leitos privados não são fáceis de acessar. Entre as perguntas que enviou à Anahp, a reportagem pediu esclarecimentos sobre as taxas de ocupação dos leitos de UTI da rede particular em meio à pandemia. Via assessoria de imprensa, a associação respondeu que “representa 122 entidades no Brasil e não possui dados de ocupação de todo o setor privado do País que, hoje, conta com mais de quatro mil instituições”. A nota explica ainda que, “para acompanhar o trabalho dos hospitais membros”, a Anahp utiliza um sistema de informação próprio, que é alimentado pelos associados com dados referentes ao mês anterior. E que não é de acesso público.  “Os hospitais [privados] têm preferido voltar a fazer cirurgias eletivas, mantendo capacidade ociosa, do que atender o SUS”, denuncia Mattos, referindo-se a procedimentos que não são de urgência e que, portanto, poderiam esperar o recuo da pandemia para não sobrecarregar os serviços.

Apesar disso, Mattos não acha improvável que, em algumas capitais e regiões metropolitanas, a taxa de ocupação esteja tão alta também na rede privada. “Todos os cenários que foram projetados de colapso dos sistemas de saúde colocavam que, independentemente da quantidade de leito que se tivesse, públicos ou privados, isso aconteceria”, diz, destacando que, de todo modo, a realidade tem mostrado que a rede privada vai ser a última a entrar em colapso e a primeira a sair. “Mas quando ela sair, o setor público ainda vai estar em colapso. Não se trata de uma medida só para este momento, em que o colapso está começando a chegar aos estados e capitais, é para toda a pandemia. É uma medida atual e necessária independentemente da capacidade que os hospitais privados tenham ocupada hoje em dia”, defende.

Organizar o sistema

O coordenador da campanha ‘Leitos para Todos’ explica ainda que essa gestão unificada das vagas não atingiria apenas a rede privada. “A fila única vale tanto para leitos privados quanto para os públicos”, diz, ressaltando que o Rio de Janeiro é um “ótimo exemplo”. “A regulação única também trataria da inclusão dos leitos de hospitais federais no cômputo geral, o que não estava acontecendo até pouquíssimo tempo, quando houve uma determinação judicial. Também incluiria hospitais de militares e de servidores, que são de uso exclusivo. Além de leitos de municípios do interior que estão segurando vagas vazias, não querendo que a demanda das capitais chegue até eles”, enumera.

A situação do Rio é exemplar porque o estado, ex-capital do país, concentra seis hospitais e três institutos federais. Parlamentares, entidades e movimentos da área da saúde têm denunciado a existência de um grande número de leitos ociosos (gerais e de UTI) nesses hospitais. Não existe informação precisa sobre a quantidade – matéria publicada pelo UOL afirma que, segundo estimativa feita pelos conselhos regionais de enfermagem (Coren-RJ) e medicina (Cremerj), esse número chegaria a 1.800. O que se sabe é que, no dia 22 de abril, a Justiça determinou que esses hospitais passassem a receber pacientes de Covid-19 encaminhados de outras unidades. Além da falta de aparelhos e insumos, como respiradores e equipamentos de proteção individual, o principal problema desses hospitais, que são administrados pelo governo federal, é a carência de profissionais.

Esse exemplo serve também para mostrar que quando se fala em terapia intensiva para os pacientes graves de Covid-19 ou de qualquer outra doença, a demanda vai muito além da estrutura física do hospital. Por isso, o levantamento feito pelos pesquisadores Margareth Portela, Claudia Pereira, Sheyla Lima, Carla de Andrade, Fernando Soares e Mônica Martins sobre a capacidade de resposta dos municípios à pressão de internação pelo coronavírus levou em conta a existência de leitos de UTI mas também de outros insumos, como equipamentos de proteção individual, respiradores, monitores de eletrocardiograma, desfibriladores, bombas de infusão e tomógrafos – todos potencialmente necessários para o tratamento da Covid-19. O resultado, referente a fevereiro deste ano, é que apenas 421 dos mais de 5.570 municípios contavam com a estrutura necessária para atender pacientes graves em meio à pandemia. E a maior parte deles está localizada nas capitais e regiões metropolitanas.

Em parte, isso expressa o desenho do sistema de saúde brasileiro, organizado em redes de assistência, a partir de regiões de saúde que juntam vários municípios para ganhar escala nos serviços de alta complexidade (sobre isso, leia mais aqui). Mas só em parte. Em outra nota técnica publicada pelo Instituto de Estudos para Políticas de Saúde, seis pesquisadores fizeram um levantamento da disponibilidade desses serviços considerando não os municípios mas as regiões de saúde brasileiras. E uma primeira conclusão é que, independentemente da pandemia, 72% das regiões não têm leitos de UTI suficientes no SUS. Segundo o estudo, mesmo somando-se sistemas públicos e privados, 279 das 436 regiões de saúde do país tinham menos de dez desses leitos para cada 100 mil habitantes. Quando se olha apenas os leitos SUS, 316 estão nessa situação, o que, de acordo com a nota, atinge 56% da população brasileira e 61% daqueles que dependem exclusivamente do SUS. Dessas, 142 não têm nenhum leito de UTI. E isso “sem a influência da Covid-19”.

Privado meio público

A relação entre público e privado no sistema de saúde brasileiro fica ainda mais complexa quando se analisa a participação do Estado no financiamento da saúde suplementar. Isso porque, como se sabe, por aqui parte das despesas com planos de saúde pode ser deduzida do imposto de renda, seja de pessoa física ou jurídica. De acordo com Carlos Ocké, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplica (Ipea), só em 2017 – últimos dados que ele tem sistematizados -, cerca de R$  20,3 bilhões deixaram de entrar nos cofres públicos para que menos de 25% da população mantivesse planos privados de saúde. Isso sem contar os R$ 11,6 bilhões de renúncia fiscal – que envolve Imposto de Renda Pessoa Jurídica, CSLL, Cofins e CPP – feita aos hospitais filantrópicos.

Por tratar-se de um procedimento muito caro, são raros os casos em que leitos de UTI, como os que têm sido demandados agora na pandemia de Covid-19, são contratados por pagamento direto. Portanto, a maioria esmagadora dos leitos disponíveis nos hospitais privados hoje são usados por clientes dos planos de saúde, esse mercado que, no Brasil, funciona com subsídio estatal. E é esse mesmo Estado que é o protagonista de um subfinanciamento que marca o Sistema Único de Saúde desde a sua origem e que se agravou nos últimos anos – cálculos de Carlos Ocké, junto com Francisco Funcia e Rodrigo Benevides mostram que, só com a Emenda Constitucional 95, aprovada em 2016 e que estabeleceu um teto de gastos para o governo federal, o SUS perdeu quase R$ 22,5 bilhões entre 2018 e 2020.

Fonte: EPSJ/Fiocruz
Publicado em 13/05/2020

Supremo adia julgamento sobre terceirização; centrais seguem na luta para STF decidir contra

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou nesta quarta-feira (9) o julgamento sobre a terceirização de qualquer tipo de trabalho. Durante todo o dia de ontem centenas de trabalhadores e representantes de entidades sindicais aglomeraram-se em frente ao STF, com bandeiras, faixas e cartazes, pedindo que o julgamento fosse adiado. O processo em questão (o recurso da Celulose Nipo Brasileira (Cenibra) contra decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que considerou ilegal a terceirização de um setor ligado à atividade-fim da empresa) não chegou a ser apreciado, talvez pela pressão das organizações sindicais ou pela falta de tempo, devido a análise de outras pautas.

 

A sessão de ontem começou com uma homenagem ao ex-ministro do STF, Cezar Peluso, em seguida vieram pautas como a constitucionalidade do protesto em cartório de Certidões de Dívida Ativa e a extradição de Salvador Siciliano. A sessão foi encerrada pontualmente às 18h, pela presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, e o processo foi retirado da pauta, sem data prevista para retornar.

O presidente da CTB, Adilson Araújo lembra decisões recentes do Supremo que afetam diretamente direitos e garantias da classe trabalhadora. “Já foi sacramentado pelo STF o fim da desaposentação, deliberado um prenúncio à prevalência do negociado sobre o legislado, se pôs fim ao direito de greve no funcionalismo público e se traz agora ao centro de uma discussão no âmbito do plenário do STF a possibilidade de legitimar exatamente a fraude nas relações de trabalho, que é a terceirização ilimitada”.

“O processo da terceirização era o 4º da pauta de hoje. O STF só julgou o primeiro e o segundo. Portanto, o julgamento do Recurso Extraordinário que trata da terceirização foi adiado sem prazo definido para voltar a ser julgado. A ordem foi aguardar a decisão da Presidenta do STF, que definirá quando o processo de terceirização voltará à pauta”, afirmou o assessor jurídico da CTB, Magnus Farkatt.

Uma decisão favorável do STF pode influenciar e resultar na aprovação do PLC 30, projeto de lei que prevê terceirização irrestrita, já aprovado pela Câmara e em tramitação no Senado. O adiamento da votação dá fôlego às centrais para resistir e continuar lutando a fim de impedir mais um ataque à classe trabalhadora, ameaçada constantemente com a perda de direitos.

Na avaliação do analista político e diretor de Documentação do Diap (Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), Antônio Augusto de Queiroz (Toninho), se aprovada, a decisão será na prática a concretização da reforma trabalhista proposta pelo governo de Michel Temer. Para completar o pacote, seria a prevalência do negociado sobre o legislado. Saiba mais aqui.

“Essa é uma das principais batalhas pós-golpe, uma decisão que além de ferir os direitos laborais contribui para completa desorganização do movimento sindical. Esta luta define o futuro próximo do sindicalismo brasileiro. A terceirização do trabalho para atividades-fim é tema de projeto de lei que tramitou e foi aprovado na Câmara dos Deputados, sob forte resistência das centrais sindicais que entendem o projeto como o fim dos direitos e garantias da CLT, já que legaliza o contrato de trabalho sem obrigatoriedade de cumprir direitos trabalhistas. O projeto aguarda análise e votação no Senado. A receita não tem contra-indicação, o remédio é lutar”, disse ontem o presidente da CTB, Adilson Araújo.

Fonte: CTB

 

Advogados trabalhistas denunciam os ataques à Justiça do Trabalho

Desde que assumiu o governo, Michel Temer iniciou o desmonte da estrutura trabalhista no Brasil. Seja através dos ataques promovidos contra os direitos trabalhistas — com apoio da bancada conservadora no Congresso Nacional, seja através da nova estrutura ministerial. Um dos seus alvos é a Justiça do Trabalho, conquista social da Era Vargas que sempre foi objeto do ódio do patronato.

A Associação Brasileira dos Advogados Trabalhistas publicou em seu site um carta na qual detalha os ataques que a Justiça do Trabalho vem sofrendo. A denúncia é gravíssima, porque mostra a ação do próprio presidente do Tribunal Superior do Trabalho para desqualificar a justiça do Trabalho como “parcial”. Leia na íntegra:

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Carta aberta da ABRAT ao Ministro Ives Gandra Martins Filho

A Justiça do Trabalho e o Direito do Trabalho continuam vítimas de ataques, que são contínuos e permanentes, a indicar que estão sintonizados. E vem por todos os lados. Executivo. Legislativo. Mídia. Todos em orquestra. Agora, de dias para cá, também se vêm atacados pelo próprio Judiciário.

Nesse triste contexto, sobreleva-se a entrevista concedida ao jornal o Estado de S. Paulo no domingo (30.10.2016), pelo Presidente do TST, Ives Gandra da Silva Martins, em que este reverbera a mácula costumeiramente pespegada à Justiça do Trabalho, a de superproteger o trabalhador. E o faz com as seguintes palavras: – “O que eu sei é que a taxa de improcedência total é muito baixa”; – “Sempre que o trabalhador entra na Justiça, ganha alguma coisa.”; – “Na pior das hipóteses, consegue um acordo.”; – “Às vezes, ele não tem razão nenhuma, mas só de o empregador pensar que vai ter de enfrentar um processo longo, que vai ter de depositar dinheiro para recorrer, acaba fazendo um acordo quando o valor não é muito alto. Isso acaba estimulando mais ações”.

Com esses conceitos, imputou a inconstitucional pecha de parcialidade (pelo menos, se não for algo muito mais grave) aos magistrados trabalhistas, juízes que entendíamos e ainda entendemos serem sérios, imparciais e honestos. Mas esse é assunto a ser debatido e resolvido internamente.

Quanto a advocacia trabalhista, a ABRAT está autorizada a objurgar (criticar) tal pronunciamento, porque desaceita a mácula da inescrupulosidade, a de patrocinadores de ações em que os trabalhadores “não tem razão nenhuma”. Os advogados trabalhistas, independente da parte que defendam, exercem patrocínio honesto, coerente com seu dever ético, mas compromissados com sua função social, em especial o dever/prazer de defender o estado democrático de direito. E sabemos que isso incomoda, notadamente a quem não gosta de cumprir as leis nacionais.

Na entrevista, o eminente Presidente do TST adota a “presunção geral da má-fé”, de que os trabalhadores ingressam com ações trabalhistas, mesmo sem “razão nenhuma”, ou seja, para se locupletaram ilicitamente, em destampada agressão à dignidade, à honra e à imagem de cada trabalhador e trabalhadora desse País.

Estranhamente, o Ministro Presidente nada disse acerca do baixo índice de cumprimento espontâneo do direito material trabalhista pelos destinatários de seus comandos normativos. E omitiu – embora saiba – que esse alto índice de inadimplência advém do fato de que, absurdamente, no Brasil é mais vantajoso ser condenado na Justiça do Trabalho do que cumprir as leis e pagar de forma espontânea. Daí surge o ditado de que o empregador ganha mais com “ações” na Justiça do que com “ações” na Bolsa de Valores.

O Ministro Ives destaca na referida entrevista a atitude do empregador em celebrar acordo para deixar de enfrentar uma demanda judicial. Entretanto, silencia a respeito do fenômeno denominado pelos processualistas contemporâneos de litigiosidade contida, em que os titulares dos direitos trabalhistas lesionados deixam, pura e simplesmente, de ingressar com ações. E não revelou que, regra quase absoluta, os acordos são danosos aos trabalhadores, que os aceita por desespero, senão por fome, que os proíbe de suportar demanda por dezenas e dezenas de anos.

Esses acordos predatórios aos direitos e à paz social emergem da falta de efetividade da tutela jurisdicional trabalhista, vez que esta torna extremamente vantajoso para grande número de empregadores, do ponto de vista econômico-financeiro, descumprir as mais elementares obrigações trabalhistas, criando uma verdadeira “cultura do inadimplemento”, em regime de concorrência desleal com a parcela ainda significativa dos empregadores que cumprem rigorosamente suas obrigações trabalhistas, legais e convencionais.

A questão crucial, relacionada ao alto número de ações trabalhistas, omitida pelo Presidente do TST, mas que não pode deixar de ser enfrentada pela sociedade, reside na falta de efetividade ou concretude dos direitos sociais.

Como bem dito pelo Ministro do TST José Roberto Freire Pimenta: “Quanto mais efetiva a máquina jurisdicional, menos ela vai ter que atuar concretamente, no futuro ou a médio prazo. Simetricamente, quanto mais os destinatários das normas jurídicas souberem que só lhes resta cumprir a lei, por absoluta falta de melhor alternativa, menos será necessário o acionamento da máquina jurisdicional e maiores eficácia e efetividade terão as normas jurídicas materiais. Quanto mais eficaz for a jurisdição, menos ela terá que ser acionada. Enquanto o direito processual do trabalho e o Poder Judiciário trabalhista não forem capazes de tornar antieconômico o descumprimento rotineiro, massificado e reiterado das normas materiais trabalhistas, os Juízes do Trabalho de todos os graus de jurisdição continuarão sufocados e angustiados pela avalanche de processos individuais, repetitivos e inefetivos.”

Como vocifera a Juíza Valdete Souto Severo, a Justiça do Trabalho: “E o ultimo reduto do trabalhador despedido sem nada receber, assediado, doente, explorado em suas horas de vida, sem qualquer contraprestação. A Justiça do Trabalho é o local em que alguns direitos ainda se realizam, num contexto em que a ausência de proteção efetiva contra a despedida torna o exercício dos direitos trabalhistas no ambiente de trabalho uma mentira. Que a ataquem os civilistas, os comercialistas, os empresários, pôde-se até compreender. É mais difícil assimilar o golpe, quando o ataque vem do próprio TST, sob o pretexto de uma falsa modernização, na qual a palavra de ordem e a livre negociação entre as partes e a fragilização das entidades sindicais.”

Destarte, o caminho da efetividade dos direitos sociais perpassa pelo fortalecimento, e não pela degradação, da Justiça do Trabalho. E como proclamado por Paulo Bonavides: “Sem a concretização dos direitos sociais não se poderá alcançar jamais a “sociedade livre, justa e solidária” contemplada constitucionalmente como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.”

A ABRAT sabe, Ministro Presidente, que a história é escrita pelos vencedores. Embora alguns digam que estamos a viver um período “após o fim”, não atingimos o tempo de canícula a ponto de tornar invisíveis os vencidos. E a Advocacia Trabalhista cuida da emancipação, entendo-a como uma maneira de viver enquanto iguais no mundo das desigualdades.

Por isso, o advogado age numa perspectiva de progressividade e não na linha do absurdo e da regressão.

Essas posturas exigem condutas dignas e honestas.

A ABRAT o afirma e pede que o Ministro Presidente do TST tome nota: a advocacia trabalhista atua nessa faixa, honestamente dignificando a paz social e o pratica, limpa e abertamente, no campo próprio, o da Justiça Social cuja sede é ou deveria ser a Justiça do Trabalho, cujos magistrados, como nós, agem com respeito, correção de caráter e zelo.

Com informações do Blog do Miro e Tijolaço

Projeto do CCS sistematiza informações sobre o coronavírus e a COVID-19

“Sistematizar as melhores evidências científicas sobre recomendações de proteção e segurança e veicular informação útil e científica por meio de diversos materiais – cartilhas, guias, vídeo, podcasts – para orientar profissionais de saúde e comunidade em geral”. Este é o objetivo do Projeto Safety, que reúne alunos e professores dos cursos de Enfermagem, Farmácia e Medicina, do Centro de Ciências da Saúde (CCS). A diretora da Escola Nacional dos Farmacêuticos, Marselle de Carvalho, coordena a iniciativa.

 

 

A professora Marselle Nobre de Carvalho é chefe do Departamento de Saúde Coletiva do CCS e coordenadora da iniciativa. Ela explica que a equipe do projeto é formada pelas professoras Sarah Beatriz Felix e Daniela Frizon Alfieri, ambas da UEL; Maria Fani Dolabela (Universidade Federal do Pará) e Naiara Lourenço Mari (UNOPAR). A equipe tem também a participação de alunos de pós-graduação (residência, mestrado e doutorado) e colaboração de profissional externo (Ana Carolina Franzon).

A professora explica que a necessidade de um projeto dessa natureza se justifica por causa da quantidade de informações disponíveis ao público, nem sempre de fontes confiáveis e até mesmo informações falsas, que acabam provocando pânico, principalmente, entre o público leigo. Marselle Nobre de Carvalho aponta que as informações são atualizadas de forma muito rápida. Por isso, o processo de produção do conhecimento científico precisa considerar as melhores evidências. Confira o áudio.

A professora Marselle Nobre de Carvalho explica que os trabalhos do Projeto Safety tiveram início no mês de março, com o treinamento das equipes. No mês passado, foi realizada a organização dessas equipes e até junho, será executada a pesquisa, com análise de documentos e artigos. Ainda de maio e junho, serão elaborados os materiais com as informações coletadas e analisadas. Entre junho e agosto, serão disseminados os resultados da iniciativa.

Ela afirma que o Projeto Safety atua em duas grandes áreas. A primeira consiste na disseminação do conhecimento científico, com relatórios técnicos para gestores e profissionais dos serviços de saúde, em linguagem técnica. A segunda frente trata da divulgação científica e da popularização da ciência, que visa atingir a população em geral e seus segmentos sociais. Por exemplo, através da rede social – @projetosafety – a equipe do Safety espera atingir o público mais jovem.

Fatos – A informação científica sempre foi importante e, em períodos de pandemia, torna-se ainda mais necessária, porque trabalha com dados que lidam com a dualidade saúde e doença, vida e morte. No entanto, um contingente importante da sociedade, inclusive internacionalmente, ameniza ou nega os efeitos do coronavírus e a letalidade da COVID-19. A professora Marselle explica que esse fenômeno ocorre porque parte da sociedade nega a ciência, com prejuízo para a coletividade. Confira áudio:

Marselle Nobre de Carvalho lembra que a COVID-19 teve início nos extratos mais altos, ou seja, entre os mais ricos, mas é no segmento social dos mais pobres que a doença é mais dramática. “A ciência trabalha com fatos, com dados. E os dados estão aí. Os números crescentes e – ainda subnotificados – demonstram que o Brasil está numa ascensão da doença, mas em algumas regiões já tendo enormes problemas sanitários, econômicos, políticos, sociais. Muitas pessoas utilizam a desinformação, a péssima informação, para propagar os seus regimes de verdade. Isso para mim é criminoso”.

Fonte: UEL
Publicado em 12/05/2020

STF julga terceirização na “atividade-fim” dia 9/11; CTB convoca classe trabalhadora contra proposta

No próximo dia 9 de novembro, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) podem discutir a procedência da extensão da expressão “atividade-fim”, ao analisar o pedido de uma empresa de produção de celulose que pretende contratar outra empresa para atividades de florestamento e reflorestamento.

 

O processo tramita no STF como Recurso Extraordinário 958252 e pode derrubar decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) que definiu a terceirização praticada pela Cenibra (Empresa Brasileira de Celulose) como “transferência fraudulenta e ilegal” de mão de obra, com o “nítido propósito de reduzir custos de produção”.

“Decisão do STF é mais um ataque aos direitos trabalhistas”, afirma assessor jurídico da CTB

Em novembro de 2015, a Procuradoria-Geral da República (PGR) divulgou parecer contrário à empresa no qual pontua que “contratar terceiros para realizar atividades-fim de uma empresa é fraude à legislação trabalhista”.

O recurso extraordinário será relatado pelo ministro Luiz Fux e, se aprovado, a decisão terá repercussão geral, ou seja, valerá para todas as demais instâncias da Justiça. Com isso, se votar a favor da terceirização, cairá a Súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), hoje o único instrumento que protege a classe trabalhadora da precarização do emprego por meio da terceirização fraudulenta.

Para o advogado Magnus Farkatt, assessor jurídico da CTB, se a decisão for pela derrubada da Súmula 331 isso representará mais um ataque aos direitos dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros. “A validade da Súmula 331 do TST, que impede a terceirização da atividade fim, é que está em pauta para entrar em julgamento. Se o Supremo mantiver esse posicionamento, a possibilidade de aprovar essa medida é muito grande. Ou seja, o Supremo já está fazendo a reforma trabalhista que o governo Temer prometeu”, afirmou Farkatt.

Ainda na área trabalhista, no dia 16, o STF pode analisar o recurso Extraordinário 593068, que discute a incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas adicionais do salário, como terço de férias, horas extras e adicional de insalubridade. Outro tema é a a aplicação da aposentadoria compulsória ao servidor público ocupante exclusivamente de cargo em comissão.

CTB em defesa dos direitos

Como resposta aos retrocessos que estão vindo do Supremo, a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) convocou para o dia 9 de novembro grande vigília na porta do STF. “Estamos convocando nossa base para um grande ato. O objetivo é conscientizar a sociedade sobre os perigos caso o projeto, que abre espaço para a terceirização ampla e irrefreável, passe no STF”, avisou o presidente da CTB, Adilson Araújo.

O dirigente ainda destacou que “o STF, em conluio com o governo golpista, vem promovendo uma afronta aos direitos da classe trabalhadora e colocando em prática a reforma prometida pelo presidente sem voto Michel Temer. As suas decisões, além de fatiar a reforma trabalhista, segue desregulamentando o trabalho em profunda afronta à Constituição Federal. Elas incorporaram às suas teses a defesa dos interesses do mercado, do rentismo e dos grandes monopólios. Livre negociação, desaposentação, negociado sobre o legislado, fim do direito de greve, corte de salários, um pacote de maldades, um verdadeiro ataque aos direitos da classe trabalhadora”.

Confira destaques da agenda do STF:

Dia 3/11

ADI 5154 – Retomada de julgamento de ADI sobre exigência de lei específica para regime previdenciário de militares

Dia 9/11

Recurso Extraordinário 958252 – Avalia se é lícita a contratação de mão-de-obra terceirizada para prestação de serviços relacionados com a atividade-fim da empresa tomadora de serviços.

Dias 16/11

ADI 2545 – Trata da imunidade das instituições de ensino superior, analisando a validade constitucional de dispositivos da Lei nº 10.260/2001, que dispõem sobre o Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior/FIES.

Recurso Extraordinário 593068 – Discute a incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas adicionais do salário, como terço de férias, horas extras e adicional de insalubridade.

Dia 17/11

Recurso Extraordinário 593068 – Discute a aplicação da aposentadoria compulsória ao servidor público ocupante exclusivamente de cargo em comissão, assim como a possibilidade de o servidor efetivo aposentado compulsoriamente assumir cargos ou funções comissionadas.

Dia 30/11

ADI 4874 – A Confederação Nacional da Indústria pede que seja declarada a inconstitucionalidade de parte da lei federal que criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e, por arrastamento, da resolução que proíbe a comercialização de cigarros que contêm aroma e sabor.

Fonte: CTB

GO: Em greve, sindicatos buscam negociação com secretário de saúde estadual

Em greve há 15 dias, os servidores da Secretaria Estadual de Saúde de Goiás (SES-GO) fizeram hoje, pela manhã, uma carreata e manifestação contra a retirada de seus direitos. “Os trabalhadores estão há 6 anos sem reajuste salarial, o plano de carreira está congelado, há uma ameaça constante de corte da gratificação de produtividade e eles aindam convivem diariamente com péssimas condições de trabalho”, explica a presidente do Sinfargo, Lorena Baía.

À tarde, representantes dos Sindicatos dos Trabalhadores da Saúde (SindiSaúde), Farmacêuticos, Enfermeiros e Odontólogos participaram da primeira reunião de negociação com o secretário de saúde, Leonardo Vilela. Os sindicatos apresentaram suas reivindicações e o secretário pediu que algumas demandas fossem formalizadas por ofício. Ele também se comprometeu em agendar uma reunião da categoria com o governador e buscar um acordo e diálogo com os trabalhadores.

Assista ao vídeo da mobilização realizada pelos grevistas em Goiânia. https://www.facebook.com/lorena.baia.5/videos/1085955081499890/

Fonte: Sinfargo

Flexibilização da Jornada: PL 4.962/2016 pode aniquilar direitos e garantias da classe trabalhadora

O advogado e membro do corpo técnico do DIAP, Hélio Gherardi, produziu parecer jurídico no qual analisa os graves e sérios prejuízos caso seja aprovado o PL 4.962/2016, do deputado Julio Lopes (PP-RJ), que trata da flexibilização temporária da jornada de trabalho e do salário mediante acordo coletivo de trabalho.

Boa leitura!

PARECER
Projeto de Lei nº 4.962/2016
Deputado Julio Lopes (PP-RJ)

O Projeto de Lei nº 4962/2016, apresentado pelo Deputado Julio Lopes, pretende alterar a redação do artigo 618 da C.L.T., objetivando legalizar a flexibilização, para que “as condições ajustadas mediante convenção ou acordo coletivo de trabalho prevaleçam sobre o disposto em lei, desde que não contrariem a Constituição Federal e as normas de medicina e segurança do trabalho”, conforme estabelece a proposta do “caput” do artigo 618 da mencionada pretensão.

Em seu parágrafo primeiro, o Projeto assevera que, no caso da flexibilização relativa a salário e jornada de trabalho, conforme incisos VI, XII e XIV, do artigo 7o. da Carta Magna, a convenção e/ou acordo coletivo “deverá explicitar a cláusula compensatória concedida em relação a cada cláusula redutra de direito legalmente assegurado”.

Em seu parágrafo segundo, o Projeto assinala que, a flexibilização estabelecida no parágrafo primeiro é limitada “à redução temporária de direito legalmente assegurado, especialmente em período de dificuldade econômica e financeira pela qual passe o setor ou a empresa, não sendo admitida a supressão do direito previsto em norma legal”.

Em seu parágrafo terceiro, o Projeto afirma que “não são passíveis de alteração por convenção ou acordo normas processuais que disponham sobre direito de terceiros”.

Em seu parágrafo quarto, o Projeto prescreve que “em caso de procedência de ação anulatória de cláusula de acordo ou convenção coletiva que tenha disposto sobre normas de medicina e segurança do trabalho, processuais ou de direito de terceiros, deverá ser anulada igualmente a cláusula da vantagem compensatória, com devolução do indébito”.

DAS JUSTIFICATIVAS DO PROJETO

Apresenta o Projeto em suas justificativas as Convenções nº 98/1949 e 154/1981 da O.I.T., a primeira sobre “Aplicação dos Princípios do Direito de Organização e de Negociação Coletiva” e segunda sobre “Incentivo à Negociação Coletiva”.

Embasa-se, também nos incisos VI, XIII, XIV e XXVI, do artigo 7º, da Constituição Federal, que preceituam:

“VI – irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
XIII – duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais, facultada a compensação de horários e a redução da jornada, mediante acordo ou convenção coletiva de trabalho;
XIV – jornada de seis horas para o trabalho realizado em turnos ininterruptos de revezamento, salvo negociação coletiva;
XXVI – reconhecimento das convenções e acordos coletivos de trabalho.”

Insurge-se contra Precedentes do E. T.S.T., que anulam cláusulas de acordos coletivos e/ou convenções coletivas prejudiciais aos trabalhadores, amparando-se no RE 590.415-SC, do C. S.T.F., sendo Relator o MM. Ministro Luis Roberto Barroso que se manifesta no sentido de que a “antonomia coletiva da vontade não se encontra sujeita aos mesmos limites que a autonomia individual . . . A negociação coletiva é uma forma de superação de conflito que desempenha função política e social de grande relevância. De fato ao incentivar o diálogo, ela tem uma atuação terapêutica sobre o conflito entre capital e trabalho e possibilita que as próprias categorias econômicas e profissionais disponham sobre as regras às quais se submeterão, garantindo aos empregados um sentimento de valor e de participação”.

Sinaliza com parâmetros que norteariam a negociação coletiva, entendendo que dariam maior segurança a empregadores e a empregados, a saber:

“a)não é possível a supressão de direito trabalhista constitucional e legalmente assegurado;
b) não é possível a flexibilização de norma relativa a medicina e segurança do trabalho, norma relativa a direito de terceiros e norma processual;
c)é possível a redução, mas apenas temporária, de direito de natureza salarial ou ligado a jornada de trabalho;
d)tal redução econômica deve ser compensada com vantagem de natureza salarial ou sindical, expressa no instrumento coletivo;
e)eventual anulação da cláusula flexibilizadora deve ser acompanhada da anulação da vantagem compensatória conexa, como imperativo da justiça e do caráter sinalagmático do acordo.”

Finalizando as justificativas, o Projeto apresenta a Medida Provisória no. 680/2015, que instituiu o Programa de Proteção ao Emprego, objetivando em sua essência a recuperação econômica-financeira das empresas, evidentemente sob a máscara da proteção ao emprego.

DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO
Qualquer legislação deve sempre ser analisada em seu todo e não separadamente, razão pela qual, não há como alterar o referido artigo 618 Consolidado, como pretende o referido Projeto, sem contrariar as disposições contidas nos artigos 9º e 468 da C.L.T., que dispõem:

“Art. 9º – Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.”

“Art. 468 – Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.”

Verifica-se, pois, que qualquer alteração do contrato de trabalho em prejuízo aos direitos já garantidos é nula de pleno direito.

E o C. Tribunal Superior do Trabalho não é o vilão que o Projeto apresenta, pelo contrário, é o fiscalizador que deve garantir que o trabalhador não seja prejudicado pela imposição do poder econômico.

DAS CONTRARIEDADES
Configura-se cristalinamente que o Projeto em comento objetiva o total amparo ao empresário, em detrimento das garantias decorrentes dos direitos trabalhistas obtidos pelas duras conquistas decorrentes das lutas e dos sofrimentos da classe trabalhadora desde a abolição da escravatura, quando o verdugo e a chibata determinavam a execução do trabalho.

Primeiramente cumpre esclarecer que as referidas Convenções nº 98/1949 e 154/1981 da O.I.T., ambas, em nenhum momento objetivam a retirada de direitos, mas sim, como suas próprias denominações assinalam, aplicar os princípios do direito de negociação coletiva e incentivar a negociação coletiva, mas jamais em prejuízo dos direitos já garantidos aos trabalhadores.

Os mencionados incisos VI, XIII, XIV e XXVI, do artigo 7º da Constituição Federal, garantem a negociação coletiva, mas consoante o próprio V. Acórdão do C. S.T.F. assinala:

“a atuação das partes com lealdade e transparência em sua interpretação e execução são fundamentais para a preservação de um ambiente de confiança essencial ao diálogo e à negociação”.

Infelizmente tal equilíbrio nunca foi visto, exceto quando os trabalhadores não tem outro caminho senão o da paralisação, quando os empregadores, aí sim, mudam totalmente seu discurso e tentam, objetiva e efetivamente solucionar a controvérsia social e econômica que vinha protelando propositadamente.

Evidentemente na aplicação dos referidos artigos do Projeto em questão, a garantia mínima será a da estabilidade no emprego, pois não é justo que determinados trabalhadores tenham seus salários, ou suas jornadas de trabalho, ou seus direitos sejam reduzidos temporariamente, sem a garantia mínima de que permaneçam no emprego, o que deveria, sem sombra de dúvida estar garantido no Projeto, mas, curiosamente, não aparece.

Por outro lado, temos que acabar com este pensamento de que as categorias profissionais no Brasil são somente as das grandes empresas, dos grandes conglomerados, olvidando-se e omitindo-se as categorias que realmente movimentam o País e a população no seu dia a dia

Qual a garantia do sentimento de valor e de participação equalitária numa negociação de uma farmácia, de uma padaria, de um posto de gasolina, de um bar, com seu respectivo empregador, que um acordo coletivo possa trazer?

Como reconhecer negociações coletivas se uma grande parte da categoria econômica; pelo nefasto parágrafo segundo, do artigo 114, da Constituição Federal, o famigerado “de comum acordo”; não concorda com o Dissídio Coletivo e em razão desta prática, inúmeras categorias encontram-se sem data-base?

Destaque-se que ressalvar as normas de medicina e segurança do trabalho e as normas processuais relativas a direitos de terceiros (como o F.G.T.S. que a própria justificativa assinala), não justifica, de maneira alguma a alteração do referido artigo 618 da forma proposta.

DO CONGRESSO NACIONAL
Os Senhores Deputados e os Senhores Senadores não se deram conta que o presente Projeto objetiva, inclusive, esvaziar o Congresso Nacional, pois se houver a prevalência do negociado sobre o legislado e o poder econômico conseguir impor suas vontades sobre a classe trabalhadora, sem qualquer forma de estabelecimento de legislação que estabeleça direitos, os mesmos não têm porque exercer suas funções, trazendo pois, em seu bojo, o desmantelamento das próprias instituições democráticas eleitas pelo povo.

CONCLUSÃO
Configura-se, desta forma, o evidente objetivo do Projeto em debate, de eliminar direitos, de coibir reivindicações, de aniquilar a representatividade efetiva das entidades sindicais profissionais, de impedir evoluções sociais e econômicas das categorias de trabalhadores,

Assim, pelas considerações apresentadas, verifica-se a necessidade da rejeição do Projeto apresentado, vez que o mesmo objetiva o aniquilamento das garantias e direitos obtidos a duras penas pela classe trabalhadora.

Era o que havia para manifestar.

Brasília, 8 de Setembro de 2016

HÉLIO STEFANI GHERARDI
Consultor Jurídico

Advogado sindical há mais de 42 anos, na qualidade de assessor de diretoria para vários Sindicatos, Federações, Confederações e C.S.B. – Central dos Sindicato Brasileiros, sendo consultor técnico do DIAP desde a sua fundação há mais de 31 anos, Advogado Militante, Pós-graduado em Direito Constitucional Processual na Unisantos, Mestrando na Unimes de Santos e foi Professor de Direito do Trabalho e de Direito Processual do Trabalho na Unidesc – Centro Universitário de Desenvolvimento do Centro-Oeste.